A Esquerda Democrática: Um Escrutínio oferecido a Augusto Santos Silva Versão para impressão
Segunda, 13 Dezembro 2010
Na sua mais recente obra, Augusto Santos Silva começa por descrever assim o nascimento da Esquerda Democrática.

É esta revelação quase bíblica que dá o mote para o dogma que sustenta as 20 teses que o ideólogo tem a amabilidade de oferecer ao escrutínio crítico.

Como contraponto à esquerda igualitária temos assim a esquerda baseada na liberdade, uma esquerda moderna, que vai no sentido do apaziguamento ideológico com a direita, justificando assim a evolução para um centro político onde ambas convergem: o social-liberalismo que é uma espécie de parceria público privada da sociedade com as elites.

Nesta parceria a sociedade assina um contrato onde em troco da sua exploração, as elites comprometem-se a garantir um Estado mínimo que providencie a educação, a saúde, a justiça e a “liberdade”, para que o proletário se apresente no seu expoente máximo de produtividade todos os dias no seu posto de exploração.

Independentemente de juízos entre aquilo que á a teoria apresentada pelo autor e a sua prática política, iremos debruçar-nos sobre este conceito basilar de liberdade, sobre o qual o autor elabora a construção teórica do seu pensamento.

“Os valores básicos da esquerda democrática são a liberdade, a igualdade, a justiça e a diferença.” Augusto Santos Silva faz assim uma analogia entre estes cinco conceitos e as cinco pontas de uma estrela. Não deixa de ser curioso uma Esquerda cujo primeiro princípio seja a liberdade faça esta analogia com a estrela de cinco pontas, nome dado á penitenciária de Lisboa, onde inúmeros presos políticos estiveram privados da sua liberdade durante o regime ditatorial Português.

No entanto, esta referência do autor remete-nos mais directamente para as suas origens maçónicas (1). Aliás o autor foi juntamente com Francisco Pinto Balsemão e José Pedro Aguiar Branco, um dos convidados da reunião anual do grupo elitista de Bildenberg em 2006 que decorreu no Canadá (2).

Estas informações são importantes para enquadrar o pensamento do autor sobre a Democracia e vão no sentido de demonstrar que se apresenta como um elitista praticante, como sabemos as diversas teorias das elites convergem num pensamento simples: A Democracia é o meio de as elites legitimarem o seu poder e a sua posição social dominante.

Posto esta pequena introdução, decidimos estudar a coerência e as contradições do conceito de igualdade, o ponto de chegada da Esquerda Democrática, pois o que nos interessa é para onde o autor nos quer levar. Partindo da Liberdade rumo à Igualdade é este o caminho de quem se afirma o ideólogo da Esquerda Democrática que escolhe esta como a dimensão principal da estrela de cinco pontas.

 

A Esquerda Democrática e os 8 elementos que constituem o conceito de igualdade:

1 Igualdade Moral

2 Igualdade Jurídica

3 Igualdade no acesso ao direito à identidade

4 Legitimidade de certas desigualdades

5 Princípio do patamar comum

6 Igualdade de oportunidades/Dinâmica do patamar comum

7 Equidade/Discriminação positiva

8 Mobilidade Social

  • Para o conceito de igualdade moral, o autor baseia-se na herança do cristianismo definindo-o como a noção da igualdade de valor entre cada ser humano: “Cada homem vale o mesmo”.

Com esta definição podemos através de um simples exercício de lógica chegar a um velho conceito socialista: Para o mesmo trabalho desenvolvido por um indivíduo (homem ou mulher), o salário correspondente terá forçosamente de ser o mesmo.

Concordamos definitivamente neste ponto: trabalho igual, salário igual, não poderia ser de outro modo.

O autor limita-se a reciclar velhos conceitos, revisitando-os e travestindo-os como algo de novo, no entanto há muito que a Esquerda defende a igualdade de direitos, indo até mais longe, no sentido da garantia dos direitos não só á figura bíblica do Homem e da Mulher, mas a todos os cidadãos sem excepção nem distinção de qualquer tipo, essa tem sido uma batalha da Esquerda revolucionária.

  • A questão da igualdade em termos jurídicos é posta pelo autor nos termos de cada cidadão ser igual perante a Lei.

À primeira vista nada temos a objectar, porém esta definição da “Esquerda Democrática” peca exactamente na parte da Democracia.

A questão principal é deixada de fora de uma maneira embaraçosamente infantil: A igualdade jurídica só tem significado se o Estado garantir o acesso universal à justiça.

Não basta a Lei ser igual para todos se as hipóteses de a fazer cumprir não forem as mesmas.

A igualdade jurídica só existe então quando a condição social não é factor de perturbação, isto é quando a capacidade económica de obter pareceres ou advogados versus a nomeação de advogados oficiosos e impossibilidade de recorrer a pareceres, não seja determinante para o desfecho dos processos jurídicos.

Vêem-me à memória referências Orwellianas do passado: ”Os animais são todos iguais – embora uns mais iguais do que os outros.”

Não espanta esta corrente de pensamento da igualdade no papel, aliás vindo de um autor defensor das teorias elitistas, faz todo o sentido que assim seja.

A lei é assim factor de opressão, pois permite à elite exercê-la contra o mais fraco que não pode sustentar os custos de um processo judicial ao mesmo nível que alguém com uma capacidade económica muito superior.

Começamos a perceber até que ponto é Democrática esta Esquerda.

  • A igualdade como o direito a não ser idêntico é o terceiro ponto apresentado.

O autor tenta assim apresentar o direito à diferença como uma base da igualdade, o direito a não fazer parte daquilo que é a norma.

A definição que se impunha foi mais uma vez deixada de lado: Igualdade como o direito ao livre arbítrio sobre opções que só ao indivíduo dizem respeito e não como o direito a ser diferente.

Diferente de quem? Diferente do quê? O direito a ser marginal é algo que não existe, pois quando há respeito pelo outro ele não é marginal pois não existe normal, o Estado não tem o direito de fazer essa distinção, para o Estado todos são iguais perante a lei.

O autor apoia aqui o que critica no ínicio da sua obra: o igualitarismo soviético.

Todos vestidos de vermelho, com a roupa da loja do partido, o emprego do partido, a cantina do partido e lá em cima a foto do grande irmão.

Tal direito não tem existência de um ponto de vista lógico formal, o que existe é o direito a Ser independentemente de como se É.

Essa sim é uma condição basilar e fundamental da liberdade. Sou (em liberdade), logo existo (plenamente).

Ao Estado não compete saber como somos, nem sequer quem somos.

Compete sim defender e garantir o cumprimento dos direitos e deveres, é para isso que existe e não para regular as escolhas pessoais dos cidadãos.

  • Legitimidade de desigualdades sociais é o quarto pilar desta definição de liberdade.

Se na mesma actividade houver alguém que se destaque pelo seu mérito pode e deve ser alvo de um tratamento diferencial face ao conjunto dos outros participantes, se e só se as condições iniciais forem iguais para todos.

Pois bem aqui aparece o lobo disfarçado de cordeiro, ou o melhor, a meritocracia de direita disfarçada de esquerda democrática.

A retórica do mérito é utilizada porque aparentemente funciona, na realidade existe todo um conjunto de pressupostos que inviabilizam o essencial desta doutrina, sejam eles o País em onde se nasce, a família em que se nasce, etc; ao exemplo da igualdade jurídica proposta, algo que existe no papel, na teoria, mas na prática manterá a diferenciação de classe.

Excepto se o autor pretende um corte revolucionário e radical que inclua a abolição de heranças, de classes e estratos sociais para desenvolver a meritocracia, bem-haja pela abertura de espírito e arrojo.

No entanto, tal entraria em contradição profunda com toda a prática política de A. Santos Silva forçando-nos a concluir que é apenas uma tentativa de escamotear a orientação ideológica subjacente à sua “Esquerda Democrática”.

  • A existência de um patamar comum, algo como um pacote tudo incluído de oportunidades sociais que seja universal é o ponto seguinte.

Mais uma vez, aqui encontramos um ponto de concordância entre a Esquerda Democrática e a Esquerda Revolucionária.

Se os homens nascem *todos da mesma maneira, porque nascem então com oportunidades diferentes?

No entanto o autor entra em contradição novamente, mas agora com o pilar anterior.

Se alguém através do seu mérito consegue acumular riqueza, condição ou poder que à partida elevem os patamares de condição, riqueza ou poder a que podem ascender, em comparação com os outros cidadãos, o patamar deixa de ser comum, e o “chão” de uns passará a ser o tecto de outros, para utilizar a analogia do próprio.

  • A dinâmica do patamar comum que se resume na constância e renovação de oportunidades, sempre com uma base universalmente igualitária sofre do mesmo mal do seu pilar irmão.Poderá um Estado garantir um ciclo indefinido de oportunidades iguais para cidadãos com posições socioeconómicas diferentes, ainda que baseadas num início igual para todos?

Infelizmente tal não é possível, pois embora o sistema seja constante existem infinitas variáveis, o que leva a uma solução indeterminada, teriam de existir tantos sistemas como indivíduos.

A crueza da Matemática arrasa todo a efabulação retórica.

O erro é tentar contrapor a política para as massas com a política para o indivíduo, porque se é errado a sociedade ser vista como apenas um todo é fantasioso ter como lema “a cada um a sua sociedade”.

A massa e o indivíduo são as duas faces que compõem a moeda.

Uma não existe sem a outra, este é o paradigma que revolucionará a Esquerda. Ao contrário do que se pensa uma política assim orientada é dentro do espaço da Esquerda Revolucionária.

  • Por último, mas nem por isso menos importante, é-nos apresentado o direito á mobilidade social.

Para existir uma pretensão a este direito, tem forçosamente de existir uma diferenciação de classes sociais. Caso contrário a questão da mobilidade não se punha.

Se existe uma diferenciação de classes então não temos uma sociedade justa e se não é justa poderá ser livre?

Para além desta incoerência, não entra a própria concepção de classes em contradição com a raiz do socialismo?

A única coerência que encontramos no pensamento ideológico subjacente é a sua materialização nas políticas desenvolvidas pelos governos da “Esquerda Democrática”.

Essencialmente são políticas de direita cobertas com retórica elaborada que acabam por ser equivalentes a fazer uma guerra em nome da Paz.

A Esquerda Revolucionária não teoriza sobre mobilidade social mas sim sobre o fim das classes.

A Esquerda Democrática, vinculada às Elites sim.

 

Concluindo, a Esquerda Democrática parte da liberdade para a igualdade, ultrapassando assim o igualitarismo.

No entanto os diversos valores demonstrados são profundamente contraditórios, revelando uma desonestidade intelectual gritante quando o autor se propõe a realizar uma obra de relevância no panorama político.

Apresenta as características essenciais do pensamento elitista dos tais “falsos amigos do povo” que aproveitam o se voto para se manterem no poder e alimentar aqueles que os financiam e não aqueles que os elegem.

A Esquerda há muito que se fala de um debate sério entre a Teoria e a Prática da Democracia, a qualidade da Democracia assim o exige.

Este debate não depende da qualidade da produção Teórica sobre o que já existe, depende sim da produção Teórica sobre o que nos apercebemos existir na prática e recusamos pôr no papel como a corrupção, a dicotomia servir o partido servir as pessoas, as ditaduras dos apparatchiks e a consequente ascensão dos medíocres que acabam por nos governar.

À obra de Augusto Santos Silva falta-lhe muito rigor para ser considerado um trabalho académico, funcionando como um panfleto propagandístico cujo valor mesmo assim é duvidoso. A melhor qualidade desta obra é o modo como está escrito, quase poético como se de um soneto sobre a Liberdade se tratasse, não vem trazer nada de novo nem de polémico ou interessante.

É uma recolha banal de ideias que vão no sentido do apaziguamento ideológico com a direita rotulando de isolacionistas todos os que não entrem dentro deste esquema do pensamento único.

Quanto ao socialismo democrático apenas uma frase do autor Bruno de Góis: “Ou é Democrático ou não é Socialismo.

Francisco Silva

(1) http://www.maconaria.net/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=143

(2) http://www.prisonplanet.com/articles/june2006/110606Attendees.htm

No começo, a liberdade: eis o que me parece caracterizar melhor a esquerda democrática. No princípio de tudo, a liberdade, sem outra qualificação ou atributo. Sem restrição que não decorra de si própria…”

 

Na sua mais recente obra, Augusto Santos Silva começa por descrever assim o nascimento da Esquerda Democrática.

É esta revelação quase bíblica que dá o mote para o dogma que sustenta as 20 teses que o ideólogo tem a amabilidade de oferecer ao escrutínio crítico.

Como contraponto à esquerda igualitária temos assim a esquerda baseada na liberdade, uma esquerda moderna, que vai no sentido do apaziguamento ideológico com a direita, justificando assim a evolução para um centro político onde ambas convergem: o social-liberalismo que é uma espécie de parceria público privada da sociedade com as elites.

Nesta parceria a sociedade assina um contrato onde em troco da sua exploração, as elites comprometem-se a garantir um Estado mínimo que providencie a educação, a saúde, a justiça e a “liberdade”, para que o proletário se apresente no seu expoente máximo de produtividade todos os dias no seu posto de exploração.

Independentemente de juízos entre aquilo que á a teoria apresentada pelo autor e a sua prática política, iremos debruçar-nos sobre este conceito basilar de liberdade, sobre o qual o autor elabora a construção teórica do seu pensamento.

 

Os valores básicos da esquerda democrática são a liberdade, a igualdade, a justiça e a diferença.”

Augusto Santos Silva faz assim uma analogia entre estes cinco conceitos e as cinco pontas de uma estrela.

Não deixa de ser curioso uma Esquerda cujo primeiro princípio seja a liberdade faça esta analogia com a estrela de cinco pontas, nome dado á penitenciária de Lisboa, onde inúmeros presos políticos estiveram privados da sua liberdade durante o regime ditatorial Português.

No entanto, esta referência do autor remete-nos mais directamente para as suas origens maçónicas (1).

Aliás o autor foi juntamente com Francisco Pinto Balsemão e José Pedro Aguiar Branco, um dos convidados da reunião anual do grupo elitista de Bildenberg em 2006 que decorreu no Canadá (2).

Estas informações são importantes para enquadrar o pensamento do autor sobre a Democracia e vão no sentido de demonstrar que se apresenta como um elitista praticante, como sabemos as diversas teorias das elites convergem num pensamento simples: A Democracia é o meio de as elites legitimarem o seu poder e a sua posição social dominante.

Posto esta pequena introdução, decidimos estudar a coerência e as contradições do conceito de igualdade, o ponto de chegada da Esquerda Democrática, pois o que nos interessa é para onde o autor nos quer levar.

Partindo da Liberdade rumo à Igualdade é este o caminho de quem se afirma o ideólogo da Esquerda Democrática que escolhe esta como a dimensão principal da estrela de cinco pontas.

 

A Esquerda Democrática e os 8 elementos que constituem o conceito de igualdade:
1 Igualdade Moral

    2 Igualdade Jurídica

    3 Igualdade no acesso ao direito à identidade

    4 Legitimidade de certas desigualdades

    5 Princípio do patamar comum

    6 Igualdade de oportunidades/Dinâmica do patamar comum

    7 Equidade/Discriminação positiva

    8 Mobilidade Social

 

  • Para o conceito de igualdade moral, o autor baseia-se na herança do cristianismo definindo-o como a noção da igualdade de valor entre cada ser humano:

Cada homem vale o mesmo”.

Com esta definição podemos através de um simples exercício de lógica chegar a um velho conceito socialista: Para o mesmo trabalho desenvolvido por um indivíduo (homem ou mulher), o salário correspondente terá forçosamente de ser o mesmo.

Concordamos definitivamente neste ponto: trabalho igual, salário igual, não poderia ser de outro modo.

O autor limita-se a reciclar velhos conceitos, revisitando-os e travestindo-os como algo de novo, no entanto há muito que a Esquerda defende a igualdade de direitos, indo até mais longe, no sentido da garantia dos direitos não só á figura bíblica do Homem e da Mulher, mas a todos os cidadãos sem excepção nem distinção de qualquer tipo, essa tem sido uma batalha da Esquerda revolucionária.

 

  • A questão da igualdade em termos jurídicos é posta pelo autor nos termos de cada cidadão ser igual perante a Lei.

À primeira vista nada temos a objectar, porém esta definição da “Esquerda Democrática” peca exactamente na parte da Democracia.

A questão principal é deixada de fora de uma maneira embaraçosamente infantil:

A igualdade jurídica só tem significado se o Estado garantir o acesso universal à justiça.

Não basta a Lei ser igual para todos se as hipóteses de a fazer cumprir não forem as mesmas.

A igualdade jurídica só existe então quando a condição social não é factor de perturbação, isto é quando a capacidade económica de obter pareceres ou advogados versus a nomeação de advogados oficiosos e impossibilidade de recorrer a pareceres, não seja determinante para o desfecho dos processos jurídicos.

Vêem-me á memória referências Orwellianas do passado:

Os animais são todos iguais – embora uns mais iguais do que os outros.”

Não espanta esta corrente de pensamento da igualdade no papel, aliás vindo de um autor defensor das teorias elitistas, faz todo o sentido que assim seja.

A lei é assim factor de opressão, pois permite à elite exercê-la contra o mais fraco que não pode sustentar os custos de um processo judicial ao mesmo nível que alguém com uma capacidade económica muito superior.

Começamos a perceber até que ponto é Democrática esta Esquerda.

 

  • A igualdade como o direito a não ser idêntico é o terceiro ponto apresentado.

O autor tenta assim apresentar o direito à diferença como uma base da igualdade, o direito a não fazer parte daquilo que é a norma.

A definição que se impunha foi mais uma vez deixada de lado:

Igualdade como o direito ao livre arbítrio sobre opções que só ao indivíduo dizem respeito e não como o direito a ser diferente.

Diferente de quem? Diferente do quê? O direito a ser marginal é algo que não existe, pois quando há respeito pelo outro ele não é marginal pois não existe normal, o Estado não tem o direito de fazer essa distinção, para o Estado todos são iguais perante a lei.

O autor apoia aqui o que critica no ínicio da sua obra: o igualitarismo soviético.

Todos vestidos de vermelho, com a roupa da loja do partido, o emprego do partido, a cantina do partido e lá em cima a foto do grande irmão.

Tal direito não tem existência de um ponto de vista lógico formal, o que existe é o direito a Ser independentemente de como se É.

Essa sim é uma condição basilar e fundamental da liberdade.

Sou (em liberdade), logo existo (plenamente).

Ao Estado não compete saber como somos, nem sequer quem somos.

Compete sim defender e garantir o cumprimento dos direitos e deveres, é para isso que existe e não para regular as escolhas pessoais dos cidadãos.

 

  • Legitimidade de desigualdades sociais é o quarto pilar desta definição de liberdade.

Se na mesma actividade houver alguém que se destaque pelo seu mérito pode e deve ser alvo de um tratamento diferencial face ao conjunto dos outros participantes, se e só se as condições iniciais forem iguais para todos.

Pois bem aqui aparece o lobo disfarçado de cordeiro, ou o melhor, a meritocracia de direita disfarçada de esquerda democrática.

A retórica do mérito é utilizada porque aparentemente funciona, na realidade existe todo um conjunto de pressupostos que inviabilizam o essencial desta doutrina, sejam eles o País em onde se nasce, a família em que se nasce, etc; ao exemplo da igualdade jurídica proposta, algo que existe no papel, na teoria, mas na prática manterá a diferenciação de classe.

Excepto se o autor pretende um corte revolucionário e radical que inclua a abolição de heranças, de classes e estratos sociais para desenvolver a meritocracia, bem-haja pela abertura de espírito e arrojo.

No entanto, tal entraria em contradição profunda com toda a prática política de A. Santos Silva forçando-nos a concluir que é apenas uma tentativa de escamotear a orientação ideológica subjacente à sua “Esquerda Democrática”.

 

  • A existência de um patamar comum, algo como um pacote tudo incluído de oportunidades sociais que seja universal é o ponto seguinte.

Mais uma vez, aqui encontramos um ponto de concordância entre a Esquerda Democrática e a Esquerda Revolucionária.

Se os homens nascem todos da mesma maneira, porque nascem então com oportunidades diferentes?

No entanto o autor entra em contradição novamente, mas agora com o pilar anterior.

Se alguém através do seu mérito consegue acumular riqueza, condição ou poder que à partida elevem os patamares de condição, riqueza ou poder a que podem ascender, em comparação com os outros cidadãos, o patamar deixa de ser comum, e o “chão” de uns passará a ser o tecto de outros, para utilizar a analogia do próprio.

 

  • A dinâmica do patamar comum que se resume na constância e renovação de oportunidades, sempre com uma base universalmente igualitária sofre do mesmo mal do seu pilar irmão.Poderá um Estado garantir um ciclo indefinido de oportunidades iguais para cidadãos com posições socioeconómicas diferentes, ainda que baseadas num início igual para todos?

Infelizmente tal não é possível, pois embora o sistema seja constante existem infinitas variáveis, o que leva a uma solução indeterminada, teriam de existir tantos sistemas como indivíduos.

A crueza da Matemática arrasa todo a efabulação retórica.

O erro é tentar contrapor a política para as massas com a política para o indivíduo, porque se é errado a sociedade ser vista como apenas um todo é fantasioso ter como lema “a cada um a sua sociedade”.

A massa e o indivíduo são as duas faces que compõem a moeda.

Uma não existe sem a outra, este é o paradigma que revolucionará a Esquerda.

Ao contrário do que se pensa uma política assim orientada é dentro do espaço da Esquerda Revolucionária.

 

  • Por último, mas nem por isso menos importante, é-nos apresentado o direito á mobilidade social.

Para existir uma pretensão a este direito, tem forçosamente de existir uma diferenciação de classes sociais.

Caso contrário a questão da mobilidade não se punha.

Se existe uma diferenciação de classes então não temos uma sociedade justa e se não é justa poderá ser livre?

Para além desta incoerência, não entra a própria concepção de classes em contradição com a raiz do socialismo?

A única coerência que encontramos no pensamento ideológico subjacente é a sua materialização nas políticas desenvolvidas pelos governos da “Esquerda Democrática”.

Essencialmente são políticas de direita cobertas com retórica elaborada que acabam por ser equivalentes a fazer uma guerra em nome da Paz.

A Esquerda Revolucionária não teoriza sobre mobilidade social mas sim sobre o fim das classes.

A Esquerda Democrática, vinculada às Elites sim.

 

Concluindo, a Esquerda Democrática parte da liberdade para a igualdade, ultrapassando assim o igualitarismo.

No entanto os diversos valores demonstrados são profundamente contraditórios, revelando uma desonestidade intelectual gritante quando o autor se propõe a realizar uma obra de relevância no panorama político.

Apresenta as características essenciais do pensamento elitista dos tais “falsos amigos do povo” que aproveitam o se voto para se manterem no poder e alimentar aqueles que os financiam e não aqueles que os elegem.

A Esquerda há muito que se fala de um debate sério entre a Teoria e a Prática da Democracia, a qualidade da Democracia assim o exige.

Este debate não depende da qualidade da produção Teórica sobre o que já existe, depende sim da produção Teórica sobre o que nos apercebemos existir na prática e recusamos pôr no papel como a corrupção, a dicotomia servir o partido servir as pessoas, as ditaduras dos apparatchiks e a consequente ascensão dos medíocres que acabam por nos governar.

Á obra de Augusto Santos Silva falta-lhe muito rigor para ser considerado um trabalho académico, funcionando como um panfleto propagandístico cujo valor mesmo assim é duvidoso.

A melhor qualidade desta obra é o modo como está escrito, quase poético como se de um soneto sobre a Liberdade se tratasse, não vem trazer nada de novo nem de polémico ou interessante.

É uma recolha banal de ideias que vão no sentido do apaziguamento ideológico com a direita rotulando de isolacionistas todos os que não entrem dentro deste esquema do pensamento único.

Quanto ao socialismo democrático apenas uma frase do autor Bruno de Góis:

Ou é Democrático ou não é Socialismo.

Francisco Silva

 

(1) http://www.maconaria.net/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=143

(2) http://www.prisonplanet.com/articles/june2006/110606Attendees.htm

 

 

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