A violência “doméstica” do nosso governo |
Domingo, 02 Outubro 2011 |
Segundo Paugam (1991)(1) a exclusão social passou a afectar nas sociedades modernas os sectores específicos da população que se mantém à margem do progresso económico e da partilha de benefícios. A pobreza e exclusão social constituem grandes desilusões da sociedade que nos havia sido “vendida” como sendo de prosperidade e progresso que iria potenciar o bem-estar crescente da população em geral. A persistência e agravamento de algumas formas de pobreza e de exclusão social e a consequente dependência de algumas famílias e indivíduos dos serviços sociais são contrários aos direitos humanos e à igualdade dos cidadãos(1) porque constituem um sintoma importante de que as necessidades mais elementares não estão a ser satisfeitas por falta de condições, o desemprego crescente é um desses sintomas que atira para a dependência dos serviços sociais um número crescente de pessoas todos os dias. O problema é que a falha é bem mais profunda e na falta de emprego que permita a subsistência começam a faltar também o apoio social restando a sobrevivência difícil diária de um número incrivelmente grande de pessoas. Com a extinção dos serviços públicos, com o desemprego e com a crescente pobreza e precariedade assistimos a uma condenação de uma grande parte da população à exclusão social, à pobreza absoluta e ainda a uma falta de reconhecimento social e de dignidade já que com um discurso de (de)meriticismo estes governos tendem a responsabilizar as pessoas pela sua condição vulnerável e nunca as suas medidas governamentais que, sabemos nós, são as verdadeiras responsáveis. Como tão bem afirma Fernandes (1991)(1), a pobreza é uma forma de privação dos direitos de cidadania. Com pobreza, seja ela absoluta ou relativa, isto é, seja pela falta de rendimentos que assegurem as necessidades de subsistência básica ou que privem as pessoas de um conjunto de hábitos, estilo de vida e actividades que são os da maioria da população, estamos perante uma exclusão social potenciada pelo próprio governo, uma retirada de dignidade, um erro governamental que põe em causa a democracia e a igualdade. Privar as pessoas de uma vida digna pela privação do direito ao trabalho e extinguir os apoios sociais e serviços públicos é uma forma de violência do governo. O governo torna-se assim agressor, opressor, e discriminador. Com a desculpa que todos já sabemos de cor e salteado: a crise, a falta de dinheiro no país, o governo de direita /central, neo-liberal sacrifica a população em benefício da banca e põe o público a pagar a dívida privada, tirando a comida a uns para pagar os iates e diamantes de outros. É um governo de violência pela calada, dissimulada, escondida, violência essa sobre a qual escutamos comummente as vítimas responder “ tem de ser assim”, “eles não têm culpa nós é que fizemos isto, fizemos aquilo agora temos de apertar o cinto”, “ é inevitável”. Estamos perante uma violência “doméstica” no sentido em que é o nosso próprio governo, por nós eleito que nos priva dos direitos essenciais à sobrevivência digna, à igualdade, à liberdade e à cidadania e claro que este tipo de violência provoca uma tensão crescente levando a comportamentos mais violentos dos empregadores para com os funcionários, das vítimas de exclusão sobre os outras pessoas e das outras sobre estas, violência contra os imigrantes, contra os desempregados, contra as minorias étnicas, contra as mulheres. Gera-se uma tensão contra tod@s pela carência, a dificuldade e a revolta que este conjunto de medidas injustas e dissimuladas provocam. Tod@s os que sejam “um outro” quer seja pela classe sócio-económica, etnia, género, localidade, país de origem, tornam-se um alvo e um responsável pela situação de crise que vivemos. Mas é importante perceber e clarificar que os verdadeiros responsáveis pela situação actual são os governos e as medidas injustificadas, irresponsáveis e destrutivas que foram tomando e que nos foram apertando sucessivamente o cerco. Porém, é altura de nos unirmos na construção de uma outra democracia que não esta, patológica e destrutiva em que temos vivido. No seu artigo(1) Isabel Dias levanta a questão “Porque é que nas sociedades democráticas que possuem como ideal o desenvolvimento social justo e igualitário, se observam, cada vez mais, situações através das quais as desigualdades se constituem e renovam?” e nós sabemos a resposta: porque não vivemos numa verdadeira democracia. Está na altura de nos unirmos na sua construção. Nádia Cantanhede (1) Isabel Dias (1998) – Exclusão social e violência doméstica: que relação? – Artigo resultante da comunicação apresentada no I Congresso Português de Sociologia Económica realizado na Fundação Calouse Gulbenkien, Lisboa, 4-6 de Março de 1998. |
A Comuna 33 e 34
A Comuna 34 (II semestre 2015) "Luta social e crise política no Brasil" | Editorial | ISSUU | PDF
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