Uma história socialista? |
Segunda, 03 Outubro 2011 |
Quando se fala no Partido Socialista em Portugal, é importante focar, também, os seus antecedentes, fundamentais para perceber a evolução do pensamento socialista e de classe em Portugal. Vejamos o caso do Partido Socialista Português, formado em 1875. Este nasce da evolução do movimento operário em Portugal, que embora reduzido pelo carácter agrícola da produção portuguesa, era suficiente para despoletar a criação de redes de associações viradas para o pensamento socialista, sindicalista e, até, anarquista. Apesar de Portugal dar mostras de algum avanço no pensamento socialista e até no tipo de associações que iam surgindo, a sua ligação à Associação Internacional dos Trabalhadores, juntamente com forte influência francesa, aceleram o processo de formação de um partido socialista em Portugal. Assim, seguindo as instruções do Congresso de Haia (1872) – criação de partidos socialistas nacionais e rejeição do anarquismo -, José Fontana começa os esforços para a criação do partido socialista, juntamente com Antero de Quental e outro integrantes do Cenáculo. No entanto, redigir um programa de partido revelou-se mais difícil do que o previsto; na verdade, a diversidade ideológica e, também, falta de cultura política, levaram a que fosse impossível chegar a um consenso. Daí ter nascido, em 1875, o Partido Socialista Português, ainda sem programa definido. A partir da sua formação e a partir do momento em que começam os Congressos do partido percebe-se que a falta de coerência ideológica e a falta de experiência política começam a dar de si, visto logo em 1878 terem começado uma série de cisões, que se vão alargando por todo o período de existência do partido. Além das várias cisões de correntes de pensamento ou de individualidades, em 1885 o PSP formula um programa de cariz federalista, inspirado em Proudhon; alheava-se, desta maneira, da luta revolucionária e do princípio marxista da luta de classes. Por outro lado, a restrita base operária vai dispersando para outros sectores políticos existentes, como o anarco-sindicalismo. Como se pode ver, apesar de um contexto algo favorável ao crescimento e consolidação de um partido de pensamento marxista, socialista, a inexperiência e o contexto político português dificultaram a sua perpetuação; e o aproximar a social-democracias já era, nesta altura evidente. Durante o período ditatorial, principalmente a partir da década de 40, o movimento socialista tenta reorganizar-se em Portugal, com a proliferação de grupos e movimentos de cariz socialista ou social-democrata, mas que nunca têm a base social e a estrutura requerida para um partido na oposição clandestino (ao contrário do que acontecia com o PCP, muito bem organizado). Mas passemos ao embrião próximo do PS: a Acção Socialista Portuguesa. Fundada em 1964 em Genebra, por Mário Soares, Manuel Tito de Morais e Francisco Ramos da Costa surgiu como uma iniciativa de agregar os pensadores socialistas portugueses, na sua maioria exilados em vários países europeus, com o objectivo não de se constituir partido mas de alargar base de apoio e forçar a luta legal. Apesar de pretender ser mais uma oposição ao regime salazarista, nunca conseguiu o enraizamento necessário para tal, nem a sua definição ideológica foi clara ao longo dos tempos. Como Rui Mateus refere no seu livro “Contos Proíbidos”, “A evolução teórica do movimento (…) é, assim, essencialmente caracterizada mais por razões empíricas de conveniência dos seus operacionais do que pelas teses dos seus “ideólogos” ou pelos princípios doutrinários que emanam do socialismo democrático.” De facto, a pressão para maior definição programático-ideológica e aproximação ao meio operário era cada vez maior, principalmente por parte de partidos socialistas estrangeiros. Uma das características definidoras da ASP, e que de certa forma se transportou para o actual PS, prende-se com as relações com a Internacional Socialista; se por um lado a evolução da ASP e a passagem a PS sempre foi apoiada pela IS(1), principalmente monetariamente, por outro lado era considerado estranho a constante demarcação da ASP face à social-democracia, a cuja família internacional queriam pertencer. Ora, é num contexto de um movimento demasiado informal e com uma estrutura organizativa fraca, com pouco apoio por parte das massas (base operária, rural ou estudantil) e com uma grande indefinição ideológica que, em 1973 se constituí o Partido Socialista, na Alemanha, em reunião do Congresso da Acção Socialista Portuguesa. O seu programa e Declaração de Princípios são aprovados em Agosto desse ano; esta declaração afirma claramente que o marxismo era aceite como inspiração teórica predominante e o seu objectivo último era uma sociedade sem classes. Assim, o Partido Socialista em Portugal, apesar de bastantes indefinições ideológicas na sua raíz, nasce afirmando-se como um partido de esquerda socialista em alternativa ao comunismo. Isto agradou, por exemplo, aos Estados Unidos da América, sempre atentos ao percurso do PS de modo a não correrem o risco da “contaminação” comunista; por outro lado, no seio da Internacional Socialista, os maiores aliados do PS eram os partidos europeus social-democratas. Cedo o PS abandonou o receio da aproximação à social-democracia, deixando de lado o folclore anti-capitalista, quando o calor dos tempos da revolução começava a esmorecer, para posteriormente se apaixonar pela terceira-via. O pragmatismo da gaveta do socialismo de Soares, as coligações com as forças mais à direita no parlamento, o convite para o FMI voltar a aterrar na Portela, os ziguezagues entre retórica oposicionista e as reformas aquando no poder são exemplificativos do anteriormente enunciado, ao mesmo tempo que são essenciais para se entender o papel do PS, realmente existente, na sociedade portuguesa pós-25 Abril, enquanto força – rotulada – de esquerda executante e legitimadora de políticas liberais. Fabian Figueiredo e Isabel Pires Contínua no próximo número [1] A ASP é aceite na Internacional Socialista no XII Congresso desta, em Junho de 1972.
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A Comuna 33 e 34
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