Vinícius de Moraes, o poeta pop |
Quinta, 15 Julho 2010 | |||
(a propósito dos 30 anos sem Vinícius, assinalados a 9 de Julho) Vinícius de Moares, diplomata, dramaturgo, poeta e compositor, foi dos poucos em seu ofício que viveu sob a premissa básica de todo aquele que escreve em versos: intensamente. Boêmio inveterado, fumante e apreciador de destilados, foi um dos três pilares básicos da Bossa Nova, ao lado de Tom Jobim e João Gilberto. Poeta essencialmente lírico, notabilizou-se pelos seus sonetos e rompeu fronteiras de classe e continentais com seus versos, suas músicas e suas apresentações ao vivo. Quando soube da doença que acabaria por vitimá-lo (hidrocefalia), não perdeu a classe, comentando: “só se for do gelo do uísque”. O “poetinha”, como era conhecido, não viveu para ver a sua obra objeto de apreciações acadêmicas. Somente na última década e meia que os meios universitários começaram a prestar atenção e dar o devido valor ao seu trabalho. Vinícius de Moraes, além de grande conquistador – casou nove vezes – cometeu o “pecado” de transcender o mundo das letras por tornar-se popular. Em 2005, "The Girl from Ipanema", versão em inglês de "Garota de Ipanema", com Astrud Gilberto, Tom Jobim, João Gilberto e Stan Getz, realizada em 1963, foi escolhida como uma das 50 grandes obras musicais da Humanidade pela Biblioteca do Congresso Americano. Segundo número de entidades relacionadas com os direitos autorais, a canção só encontra sucesso semelhante em Yesterday, dos Beatles. Os shows em que Vinícius de Moraes participava aconteciam em formato de “happening”. Ao lado de Tom Jobim, Baden Powell ou Toquinho, os seus parceiros mais conhecidos, sentava-se numa mesa em palco, onde não faltavam o caderno de anotações, o cinzeiro e uma garrafa de uísque legitimamente escocês. Talvez devido à timidez conhecida de seus parceiros, Vinícius cumpria o papel de mestre-de-cerimônias nesses concertos. Falava muito, apresentava as canções, fazia comentários, contava anedotas e, é claro, também bebia muito. Famosa ficou também a sua enorme banheira, em que passava as tardes, e que tinha, num canto, uma tábua atravessada onde ficava o papel para escrever versos e a garrafa de uísque sempre presente. Os seus amigos, quando lhe visitavam, tiravam a roupa e metiam-se também na água, e o convívio continuava. Por essa maneira peculiar de ser, foi despedido do serviço diplomático durante os anos de chumbo da ditadura militar brasileira, em 1968. Quando isso aconteceu, encontrava-se em Portugal num concerto. Após o espetáculo, estudantes salazaristas estavam aglomerados na porta do teatro para protestar contra o poeta. Aconselhado a retirar-se pelos fundos do teatro, o poetinha preferiu enfrentar os protestos e, diante dos manifestantes, começou a declamar "Poética I" ("De manhã escureço/De dia tardo/De tarde anoiteço/De noite ardo"). Para surpresa geral, um dos jovens tirou a capa do seu traje acadêmico e a colocou no chão para que Vinicius pudesse passar sobre ela, o que foi imitado pelos outros estudantes. A grande virada na vida de Vinícius de Moraes aconteceu quando procurava alguém para musicar a sua peça intitulada “Orfeu da Conceição”. Um amigo apresentou-lhe o pianista Antônio Carlos de Almeida Brasileiro Jobim, que na altura tinha 29 anos e vivia da venda de músicas e arranjos musicais e ainda trabalhava à noite em boates obscuras de Copacabana. Desse encontro, surgiria talvez a mais fecunda parceria da música popular brasileira. Entre 1957 a 1958, o realizador francês Marcel Camus filmou no Rio de Janeiro “Orfeu Negro”, uma adaptação da peça de Vinícius. Um ano depois, o filme seria contemplado com a Palma de Ouro no Festival de Cinema de Cannes e o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Desse lote de canções, saíram “Se todos fossem iguais a você” e “Felicidade”. Em 1958, a dupla Tom-Vinícius conheceria aquele que traria a batida sincopada que revolucionou a maneira de tocar violão e espalhou-se pelo mundo inteiro sob o epíteto de Bossa Nova: o baiano João Gilberto. As harmonizações jobinianas e o novo ritmo foram saudados com grande euforia no mundo do jazz norte-americano. Desse encontro de culturas, saiu o famoso e já citado álbum em parceria com o saxofonista Stan Getz. Vinícius, Tom e João ganharam o mundo e até hoje são a referência maior daquilo que se convencionou chamar de Música Popular Brasileira, a MPB. Alexandre Cavalcante, músico, Brasil Notas da redacção: “Orfeu Negro” no Youtube aqui , O Operário em Construção aqui , Garota de Ipanema no youtube aqui , o filme da vida de Vinícius aqui
|
A Comuna 33 e 34
A Comuna 34 (II semestre 2015) "Luta social e crise política no Brasil" | Editorial | ISSUU | PDF
A Comuna 33 (I semestre 2015) "Feminismo em Ação" | ISSUU | PDF | Revistas anteriores
Karl Marx