Não sei se Miguel Relvas será ministro quando este artigo for publicado. Apesar das facadas nas costas dadas por acólitos do PSD, forças estranhas o têm segurado: interesses poderosos ou simples falta de vergonha própria e do primeiro-ministro? Sem dúvida, o “buldózer do governo” merece acabar soterrado sob o monte de destroços que deixou, em especial nos múltiplos ataques à democracia local. O pior é que o triste currículo político e académico de Relvas, acrescentado com a lei “mata-freguesias”, pode sobreviver à sua passagem pelo governo. Desde que o Documento Verde anunciou a extinção massiva de freguesias (os municípios são a etapa seguinte), o BE colocou como condição prévia a qualquer reforma territorial que as populações sejam não apenas ouvidas, mas chamadas a decidir sobre a mesma. Em 6 de Fevereiro o Bloco apresentou um projeto de Lei sobre o regime de audição e participação das autarquias locais e populações no processo legislativo de criação, extinção, fusão e modificação territorial de autarquias locais que consagrava o referendo local obrigatório e vinculativo. Nenhum outro partido de oposição apresentou alternativas mas, na hora da votação, CDS, PSD, PS, PEV e PCP votaram contra o referendo. Apesar da contestação que culminou na grande manifestação da ANAFRE, de 31 de Março, a iniciativa do governo foi aprovada e promulgada por Cavaco Silva é hoje a Lei 22/2012, de 30 de Maio – a Lei da RATA – Reforma Administrativa Territorial Autárquica. A esmagadora maioria dos eleitos locais tem repudiado a extinção de freguesias, mas esta pode tornar-se realidade já a partir de 14 de Outubro, data limite para a pronúncia das Assembleias Municipais e de Freguesia. E como muitos órgãos recusam (e bem) tornar-se cúmplices da aplicação da Lei da RATA., uma “unidade técnica” levará ao parlamento o novo mapa das freguesias, redesenhado à revelia das populações. Perante a ameaça iminente, as deputadas e deputados municipais do BE propuseram a convocação de referendos locais (aprovada para já em Barcelos) que mobilizem o voto popular (e não apenas o dos eleitos) em defesa das freguesias. Infelizmente, em Beja, Odemira e Serpa (aqui com a piedosa abstenção do PS), PSD, PS e CDU recusam a realização de referendos locais que seriam o principal obstáculo à extinção de freguesias. Em Almodôvar aguarda-se a convocação duma Assembleia Municipal extraordinária para deliberar sobre o referendo. Muita água vai correr no Guadiana até sabermos quais as freguesias a extinguir – a lei é tão arbitrária que apenas fixa percentagens: 50% das urbanas e 25% das rurais. Em Outubro, quando alguns acordarem para “ouvir” e mobilizar as populações, poderá ser tarde. Aqui fica o aviso: não há tempo a perder! É preciso “tocar sinos a rebate”, de norte a sul, contra um governo que vende o país a retalho, rouba salários, subsídios e pensões, fecha escolas, tribunais, hospitais, centros de saúde e postos de correio, batendo recordes do desemprego e agravando todos os problemas, incluindo o défice. As freguesias, que o governo “troikiano” julgava o “elo mais fraco” da democracia local, podem ser um osso duro de roer se as populações forem chamadas não só a manifestar-se, mas também a decidir sobre o futuro da sua terra.
Alberto Matos
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