Vozes de Mulheres |
Sábado, 06 Outubro 2012 | |||
Uma cantou, outra gritou. Elas foram manchete repetida em todos os noticiários naquela dia em que tudo correu mal para quem quer aparentar uma normalidade e tranquilidade falsas. Até a bandeira deu sinais do mal-estar dum povo e dum país. Ana Maria e Luísa dois nomes de mulheres que naquele dia trouxeram à luz do dia o sentir de tantas mulheres portuguesas. Ana Maria Pinto cantou “Firmeza” e apesar de o fazer sozinha, disse que ao cantar não se sentiu só e que cantou porque neste momento é preciso resistir, não cooperar, protestar. E que é preciso firmeza. Luísa Trindade irrompeu pela sala confortável e atapetada onde se faziam discursos de circunstância para gritar a sua indignação, a sua frustração, a sua revolta por aos 57 anos ter uma reforma miserável que não chega a 300€ e que sem a ajuda do filho não consegue viver, quando o Estado não a quer ouvir nem quer saber dela para nada. São estas vozes, esta coragem, este desassombro, esta revolta que vieram à tona num 5 de Outubro comemorativo da implantação da República. Eram vozes que não estavam no programa nem no guião, o protocolo não as tinha previsto, mas fizeram o dia em que pela última vez o 5 de Outubro foi dia feriado. Na véspera, mulheres da Marcha Mundial das Mulheres de vários países da Europa lançavam em simultâneo uma campanha feminista anti-austeritária europeia, sob o lema “A dívida dos governos é com as mulheres, não com os bancos”. Lisboa e Ponta Delgada em Portugal juntaram-se nesta iniciativa a várias cidades da Galiza, Catalunha, País Basco, França, Itália, Suíça, Bélgica, Roménia e Turquia. No folheto então distribuído no Largo de S. Domingos em Lisboa, podia ler-se: Esta “crise” criada pelo mundo da finança e aplicada pelos governos a seu mando espalha-se em Portugal e nos países do sul da Europa e os discursos que cá ouvimos são os mesmos que os povos de Espanha, de Itália, da Grécia ouvem todos os dias. Todos os dias ouvimos falar na “crise” e na “inevitabilidade” da austeridade e todos os dias a sentimos nas nossas vidas, nas nossas casas. A propósito da “crise” já nos mandaram emigrar, já nos chamaram piegas, já disseram que temos vivido acima das nossas possibilidades, já disseram que éramos cigarras… (…) As respostas a estes discursos e a estas políticas suicidas têm de passar pelos povos, pelos milhões de mulheres e homens que vivem diariamente esta “crise” e que não vislumbram futuro. É pela denúncia, pela recusa, pela mobilização que passa a solução. Uma solução verdadeiramente transformadora e emancipatória, na qual as mulheres têm um papel fundamental. O sucesso da campanha passa por cada uma de nós que queira dar voz, visibilidade e energia a um protesto forte e alargado, que ultrapasse as nossas fronteiras e junte as vozes de muitas mulheres que não se resignam. A próxima iniciativa desta campanha europeia da Marcha Mundial das Mulheres lançada a 4 de Outubro, é já no próximo dia 17 de Outubro, dia da erradicação da pobreza, com acções em torno da banca. As acções que fizermos cá terão, tal como as promovidas pelas mulheres de outros países, o mesmo denominador comum – denunciar o garrote das medidas do governo a mando da troika e dos interesses financeiros nas nossas vidas. Porque acreditamos na capacidade, na força e na coragem das mulheres, lutaremos contra a austeridade porque sabemos que nada é inevitável. Outras vozes e muitas mais vozes se farão ouvir e juntar-se à serenidade e à revolta da Ana Maria e da Luísa. Almerinda Bento Coordenação Portuguesa da Marcha Mundial das Mulheres http://mulherescontraausteridade.blogs.sapo.pt
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A Comuna 33 e 34
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