Presidenciais Brasileiras 2014: onde andam as esquerdas no 2º turno? Versão para impressão
Quinta, 16 Outubro 2014

eleições 2014 Foto Geraldo Magela Agência Senado. alguns direitos reservados.A 26 de outubro, realiza-se o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras. Como o Brasil é uma república presidencialista, a chefia do Estado e do Governo estão a cargo da pessoa que é eleita para a presidência da república. Que projeto governará o Brasil é o que está em causa nessa segunda volta onde se defrontam a atual presidenta, Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT), e o senador Aécio Neves do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), partido que tal como o PSD português é a maior força política da direita. A pergunta que se impõe é: onde andam as esquerdas no 2º turno?

I - Maiores centrais sindicais estão com Dilma

Na terça-feira, dia 14 de outubro, cinco centrais sindicais manifestaram em Salvador da Bahia o seu apoio a Dilma: a CUT (Central Única dos Trabalhadores, maior central, historicamente ligada ao PT), a Força Sindical (criada para fazer oposição à CUT e ao PT, segunda central sindical do país em número de sindicatos e sócios é constuída essencialmente por micro-sindicatos com uma média de menos de 600 sócios por cada sindicato), a UGT (União Geral dos Trabalhadores, terceira maior, com perto de um milhão de membros), CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Bahia, central com mais de meio milhão de membros) e a Nova Central.

II - 4 deputados do PSoL votam em Dilma, mas "Dilma não nos representa"

Respeitando a liberdade de voto decidida pelo partido para o segundo turno, sob o mote "Dilma não nos representa. Nenhum voto em Aécio", 4 dos 5 deputados federais do PSoL publicaram uma declaração coletiva de apelo ao voto em Dilma. O ponto de partida destes eleitos é: "um pleito em 2º turno, quando nosso projeto partidário não está ali representado, é mais uma eleição do não do que do sim". Os quatro signatários são: Edmílson Rodrigues (Pará), Chico Alencar (Rio de Janeiro), Jean Wyllys (Rio de Janeiro), Ivan Valente (São Paulo).

Manifestam "preocupação o avanço conservador no Congresso Nacional, com a votação expressiva de representantes da ultradireita, do fundamentalismo, do corporativismo empresarial e latifundiário, do ruralismo antirreforma agrária e violador dos direitos indígenas, do patrimonialismo, do discurso de ódio à diversidade e aos direitos humanos e do clientelismo dos currais eleitorais". E situam a disputa entre o campo composto por "setores mais à direita, do privatismo total, da corrupção estrutural e sistêmica, de parte significativa da mídia grande e dos avessos à participação popular alinhados com Aécio, isto é, com PSDB, DEM, PTB, PSC" e o campo liderado pela atual presidenta,  "com as evidentes contradições do PT e do governo Dilma, assemelhado aos tucanos até na continuidade da corrupção, alinham-se movimentos, personalidades e partidos com viés mais progressista".

O apelo ao voto em Dilma no segundo turno serve para o combate às forças sociais e políticas mais conservadoras e retógradas que compõem a candidatura de Aécio. No entanto, os 4 deputados do PSoL apelam ao voto em Dilma "sem qualquer intenção de participação num eventual novo governo ou de formar 'base de sustentação' a ele, manteremos nossa condição de oposição programática de esquerda". E declaram prosseguir o combate por "uma  Reforma Política com participação popular, por Reforma Tributária que grave os mais ricos, por políticas de superação estrutural da desigualdade social e inter-regional, pela auditoria da dívida, pelo combate a todas as discriminações, por uma política externa independente da hegemonia estadunidense e por um Brasil livre, soberano, justo, igualitário e fraterno".

No primeiro turno Luciana Genro (PSoL) manteve o partido quarta candidatura mais votada nas presidenciais e duplicou a votação obtendo 1 milhão 612 mil 186  votos (1,55%), e o PSoL passou de 3 para 5 deputados federais. O PSoL cresceu em apoio com base em setores mais radicalizados da sociedade ligados às manifestações populares de junho de 2013.

III - PSTU, PCB e PCO apelam ao voto nulo

O PSTU, Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado, que no primeiro turno teve 91 mil 209 votos (Zé Maria, 0,09%) apela ao voto nulo nomeadamente porque o Governo gasta mais com o "Bolsa banqueiro", benefícios à Banca, do que com o Bolsa Família.

O Partido Comunista Brasileiro, que teve 47.845 votos (Mauro Iasi, 0,05%), apela ao voto nulo recordando que em 2010 "o PCB recomendou o voto crítico no PT no segundo turno e, no entanto, os governos de Lula e Dilma mantiveram as políticas neoliberais e ainda aprofundaram as privatizações e o ataque aos direitos dos trabalhadores". Ainda assim não deixa de afirmar que o "PSDB é uma opção nefasta à classe trabalhadora, pois aposta no aprofundamento das privatizações, no arrocho salarial, na criminalização dos movimentos sociais e da pobreza, privilegiando o Estado máximo para o capital e mínimo para os trabalhadores"; e "representa a aceleração de pautas ultraconservadoras, como o combate às causas LGBT, redução da maioridade penal, a privatização do sistema carcerário e a criminalização do aborto".

Também o PCO Partido da Causa Operária, que teve 12 mil 324 votos do (Rui Costa Pimenta, 0,01%), apela ao voto nulo com base na política de privatizações do Governo Dilma.

IV - PCdoB com menos força na coligação de Dilma

Dilma venceu o primeiro turno com 41,09%, abaixo dos resultados do PT primeiro turno de 2002 (Lula, 45.4%), 2006 (Lula, 48.6%), e 2010 (46.8%, já com Dilma). A generalidade dos partidos da coligação "Com a Força do Povo", liderada pelo PT, recuam no número de mandatos. No entanto novas forças se afirmam na coligação.

Na coligação o PT tem a re-candidata à presidência e é a maior força política, embora desça de 88 deputados/as federais, em 2010, para 70. É ao PMDB (partido centrista/"partido-ônibus" que desce de 78 para 66 mandatos) que cabe a candidatura a vice-presidente, com Michel Temer. O PCdoB Partido Comunista do Brasil está entre os mais pequenos parceiros da coligação e desce de 15 para 10 mandatos.

O terceiro maior partido apoiante de Dilma é o PSD Partido Social Democrático, registado em 2012 (trata-se de um partido liberal fundado por dissidentes do partido Democratas, do Partido Progressista, e do PSDB, conseguiu 37 mandatos). O quarto maior membro da coligação é o PP Partido Progressista (partido com raízes na ditadura militar, na transição e que apoiou o governo do PSDB nos anos 1990, desce de 48 para 36). Juntam-se a estes: o PR Partido da República (unificação do conservadores do Partido Liberal com os ultra-nacionalistas do PRONA, desceu de 38 para 34), o PRB Partido Republicano Brasileiro (democrata-cristão ligado à Igreja Universal do Reino de Deus, subiu de 9 para 21), o PDT Partido Democrático Trabalhista (membro da Internacional Socialista, desceu de 26 para 19) e, ainda, o PROS Partido Republicano da Ordem Social, registado em 2013 (cuja principal reivindicação é a redução de impostos e alcançou 11 mandatos na câmara dos deputados).

V - Quem ainda acredita nos (ex)Verdes brasileiros?

Marina Silva (21,32%) fez da "nova política" uma capa para políticas económicas escritas por (ex)psdb's. E o seu apoio pessoal e dos partidos da sua coligação a Aécio tiram quaisquer dúvidas sobre a antiga candidata do Partido Verde (presidenciais de 2010) e hoje líder do grupo político REDE (Rede Sustentabilidade).

Marina Silva, agora candidata do PSB Partido Socialista Brasileiro, fez manchetes com a perspetiva de passar à segunda volta segundo diversas sondagens, quando passou a presidenciável por falecimento do cabeça de lista Eduardo Campos. Mas gradualmente foi-se tornando claro que Marina representava uma segunda linha do PSDB. Ainda assim, subiu de 19,33% em 2010 para 21,32%.

A atual cedência da ex-militante do PT e do PV a setores mais conservadores revelou-se quando quando respondeu afirmativamente ao "twitt" do influente e reacionário pastor Cilas Malafaia contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo: "Aguardo até segunda uma posição de Marina. Se isso não acontecer, na terça será a mais dura fala que já dei até hoje sobre um presidenciável". No dia seguinte, Marina faz uma errata ao programa deixando cair a defesa do "casamento civil igualitário" e moderando muito a linguagem do capítulo "LGBT".

Também o candidato Eduardo Jorge, do Partido Verde, declarou junto com o seu partido o apoio a Aécio na segunda volta, revelando a base liberal das reivindicações dos Verdes brasileiros. Progressistas nas questões LGBT e na legalização da cannabis, por exemplo, mas apoiantes do projeto político-económico da direita. Com apenas 0,61% de votos, o candidato do PV colhia muita simpatia em alguns setores da esquerda mas: a segunda volta não engana.

VI - Aécio quer "Muda(r) Brasil" com quem?

O candidato Aécio Neves, do partido de direita PSDB, foi apoiado na primeira volta pela coligação Muda Brasil, obtendo 33,55% dos votos. De longe a maior força da coligação é o PSDB (aliás candidatam presidente e vice) e os tucanos mantém 54 mandatos na Câmara dos Deputados.

Na coligação liderada pelo PSDB ficou em segundo lugar o  PTB Partido Trabalhista Brasileiro (atual partido de Fernando Collor de Mello, que sobe de 21 para 25 mandatos), seguido do  DEM Partido Democratas (membro da Internacional Democrata centrista, antiga Internacional Democrata Cristã, desce de 42 para 22). O quarto maior grupo da coligação é o SD Partido da Solidariedade, fundado em 2013, que elege 15 mandatos, e é presidido pelo Paulinho da Força, ex membro do PDT e líder da Força Sindical (apesar do seu apoio a Aécio, a central sindical apoia Dilma).

Formam ainda parte da coligação de Aécio: PTN Partido Trabalhista Nacional (que apoiou Dilma em 2010, atingiu os 4 mandatos, entre os quais a pastora evangélica Christiane Yared, que entra pela primeira vez na câmara e logo como a mais votada do Estado do Paraná); o PMN Partido da Mobilização Nacional (força que apoiou Lula apenas em 2002 e desde aí apoia o PSDB, desce de 4 para 3); o PEN Partido Ecológico Nacional (fundado em 2012 e presidido por Adilson Barroso, líder da Assembleia de Deus e ex-deputado estadual de São Paulo pelo PSC Partido Social Cristão, elegeu 2),  PTC Partido Trabalhista Cristão (este partido chamava-se Partido da Reconstrução Nacional quando em 1989 elegeu Collor de Mello presidente da república, com o impeachment de Collor, este partido tornou-se residual mas nos anos 2000 conquistou algum espaço, em 2010 apoiou Dilma, sobe de 1 para 2); PTdoB Partido Trabalhista do Brasil (dissidência do PTB, desce de 3 para 1).

Na segunda volta a estes partidos  juntam-se os apoios dos referidos candidatos (ex)Verdes brasileiros Marina (cujo partido, PSB, passa de 33 para 34 deputados e aliados: PPS de 12 para 10, PHS de 2 para 5, PRP de 2 para 3, PSL mantém 1) e Eduardo Jorge (PV desceu de 14 para 8 deputados federais). Com o apoio a Aécio, ficam assim em companhias nada recomendáveis como a dos candidatos homofóbicos do Partido Social Cristão (Pastor Everaldo com 0,75%, PSC desce de 17 para 12 deputados federais) do Partido Social Democrata Cristão (José Maria Eymael com 0,06%, PSDC elegeu 2 deputados) e do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (Levy Fidélix com 0,06%, PRTB passou de 2 para 1).

VII - Não há certezas sobre quem vencerá o segundo turno, mas talvez a melhor síntese seja a do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto: "se a vitória do PT não significa uma vitória dos trabalhadores, a vitória de Aécio Neves significa uma derrota dura para os trabalhadores e as lutas populares". O MTST apela ao voto em Dilma no segundo turno mas com um apoio crítico. Afirma o MTST que em 12 anos de PT: "não houve reforma urbana e agrária, reforma tributária progressiva, reforma do sistema financeiro, democratização das comunicações, nem medidas de enfrentamento à estrutura conservadora do Estado brasileiro".

Bruno Góis

imagem: Eleições 2014.Foto Geraldo Magela Agência Senado. alguns direitos reservados.

ver também: As tartarugas e o Sol do Brasil

 

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