Classe trabalhadora e política internacional |
Segunda, 13 Outubro 2014 | |||
... a necessidade de uma política internacional da classe trabalhadora emergiu na consciência do movimento operário.
Editorial por Bruno Góis - A Comuna 32 (II semestre, outubro 2014)
1. Há 150 anos, a 28 de Setembro de 1864, foi fundada a Associação Internacional dos Trabalhadores. Embora tenha durado apenas até 1876, esta organização da qual foi dirigente Karl Marx teve um papel histórico no assumir da classe operária como sujeito político. A necessidade de uma política internacional da classe trabalhadora emergiu na consciência do movimento operário. A I Internacional, como ficaria conhecida na história do movimento operário, foi fundada no encontro internacional de operários realizado no St. Martin's Hall de Londres. A solidariedade internacional da classe trabalhadora revelou-se fundamental para a luta pelos seus interesses. Contudo, em 1871, a derrota da Comuna de Paris será um dos elementos determinates para o agudizar de divergências e o fim do movimento. O confronto Marx-Bakunin e a repressão ao movimento operário marcam os últimos anos. Após a dissolução oficial da I Internacional na conferência de Filadélia (1876), houve tentativas infrutíferas de refundação. Os anarquistas passaram a reclamar a continuidade e/ou o restabelecimento da organização, originando a AIT de 1922. Em 1889 foi criada a II Internacional, Internacional Operária e Socialista, esta já de cunho marxista. 2. O mote do número 32 d' A Comuna é precisamente o processo que se desencadeia cinquenta anos depois: a I Guerra Mundial, 1914-1918. Neste centenário, recordamos como a guerra imperialista foi uma sublimação das crises do capitalismo. E como dela resultaram profundas mudanças a nível mundial quer na divisão do poder entre as potências, quer no movimento operário: com a quebra da solidariedade internacional da classe por parte da social-democracia, no apoio às respetivas burguesias na guerra, por um lado, e com a Revolução Russa e a III Internacional, por outro. Alberto Matos abre este número com um artigo chave que nos lança luzes para ler não apenas os demais artigos mas principalmente as lutas presentes. Imperialismo, guerra, questão nacional, Palestina, polémica da Ucrânia, posições antiguerra, o problema do "Estado Islâmico" são os temas dos artigos. E aproveitamos aínda, porque a memória é capital de luta, para noticiar as comemorações do centenário da fundação da União Operária Nacional, em Tomar. Sobre a Palestina, A Comuna apresenta um dossier com contributos de Shahd Wadi, Juliano Medeiros, José Fort, Eduardo Galeano, Noam Chomsky, Claudio Daniel, e Bruno Góis. Do sentimento de impotência e deseperança perante o genocídio à necessidade do boicote ao Estado de Israel, das repetições infinitas do massacre aos interesses criminosos dos EUA, do sofrimento quotidiano das crianças aos nomes incompletos daquelas vítimas mortais. Em 50 dias de intervenção militar, o Estado de Israel matou mais de 2 100 palestinianas e palestinanos. Publicamos ainda uma secção de polémica: diferentes opiniões e perspetivas sobre a crise da Ucrânia. Gaël De Santis demonstra como a UE oferecia apenas mais austeridade à Ucrânia. Alex Callinicos critica os que ao falarem de golpe fascista "papagueiam a propaganda de Moscovo". Opinião diferente tem Samir Amin que tem esperança numa política internacional euroasiática ao serviço dos trabalhadores e dos povos. Juliano Medeiros considera que não se trata nem de golpe nem de revolução. Isabel Pires e Diogo Barbosa traçam a panorâmica da história da Ucrânia. Na secção de Teoria publicamos um artigo de Eric Hobsbawn sobre Lenine e o conceito de aristocracia operária. Na opinião de Hobsbawn, a caracterização da aristocracia operária, intimamente ligada ao imperialismo, foi uma "das contribuições mais fundamentais e brilhantes de Lenine para o marxismo". 3. Na secção sobre partidos, começamos com uma análise geral, por Joachim Jachnow, sobre como os Verdes Alemães cederam também à política da guerra e ao capitalismo de marca verde. E terminamos com a análise de uma decisão polémica da Aliança Verde-Vermelha da Dinamarca. O dirigente dinamarquês Michael Voss aborda o apoio parlamentar ao envio de armas para o Afeganistão para combater o ISIS. Na raiz da polémica está a "coincidância tatica" com a agenda dos EUA, sob o argumento de que "todas as forças curdas criaram uma frente militar comum para combater o Estado Islâmico". É preciso olhar para o "Estado Islâmico do Iraque e da Síria" (ISIS) com a experiência que ambas as guerras mundiais deram ao movimento operário. Nem alinhar em jogadas inter-imperialistas, nem fechar os olhos ao perigo fascista. Fazer das forças curdas a pedra de toque desta questão será acertado. Mas não pode haver qualquer equívoco sobre a relação com os EUA, não podemos aceitar os EUA como polícias do mundo. Caso uma intervenção internacional se revele inevitável, a Organização das Nações Unidas e, dentro do quadro desta, a cooperação dos Estados vizinhos são condições necessárias. 150 anos depois, num tempo em que as internacionais dividem muito e articulam pouco, a questão mantém-se e estes artigos traçam apenas panorâmicas e polémicas: que política internacional para a classe trabalhadora? Bruno Góis Editorial - A Comuna 32 (II semestre, outubro 2014)
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