Cancun: quando os responsáveis pela crise climática obtêm todas as concessões e as vítimas nenhumas Versão para impressão
Segunda, 03 Janeiro 2011

O capitalismo tem vindo a provocar crises sucessivas e mostra, mais uma vez, como é totalmente incapaz de as resolver. Permanecendo as resoluções tomadas em Dezembro de 2010 na Cimeira Mundial das Nações Unidas para o Clima reunida em Cancún em Dezembro passado,os cientistas prevêem o agravamento da temperatura para 3,5 - 4 graus C. As consequências são devastadoras, portadoras de morte, mas para muitos ainda desvalorizadas e irreais.
Mais do que uma cimeira da ONU esta parecia uma cimeira da Organização Mundial de Comércio, mas agora de Carbono. Os acordos de Cancun exaltam o negócio de carbono e da floresta. O mercado de licenças de emissões de CO2, que deveria acabar em 2012, vai ser prolongado e contem um excesso de títulos de emissão que faz com que os países "desenvolvidos" não tenham que tomar mais nenhuma medida para conter ou reduzir as suas emissões. A isto se junta o negócio da floresta: mais uma vez, os países que querem poluir podem comprar títulos de floresta tropical dos países onde estas residem para que sejam preservadas, estes títulos passarão a ser negociados no mercado financeiro. As negociações deste programa (REDD) não ficaram concluídas, mas desde já muitas questões se levantam: continua o negócio, com contornos especulativos, agora da floresta que a partir deste mercado passa a ter novos donos (?), privatizam-se as florestas (?) e os povos que lá habitam e destas necessitam para o seu sustento (?), quem monitoriza a protecção dessas florestas (?), até que ponto é que o dinheiro que vai para estes governos será para a protecção florestal e para a ajuda aos povos que dela dependem (?). Este fundo de protecção de florestas parece ser mais uma artimanha para continuar a poluir mas com a cara pintada de verde, agora com uma nova oportunidade de privatização e de especulação: as florestas, o uso da terra e os títulos a negociar.
E como a maioria dos líderes actuais não antevêem alterar o rumo das alterações climáticas aprovam antes um fundo de adaptação a estas, a ser gerido pelo Banco Mundial e negociado com os países vítimas de catástrofes em que a desigualdade entre as partes é sempre evidente. Entendido este fundo como mais um dos fundos de ajuda ao desenvolvimento, concedido a título de empréstimo e com perpetuação dos esquemas da dívida.
Muito convenientemente, e com a quantidade de títulos que se podem comprar e com os vários esquemas criados a única coisa que não é necessário fazer é reduzir efectivamente as emissões de gazes de efeito de estufa. Não se estabeleceram nenhuns compromissos de redução de emissão de CO2 e outros e adiou-se qualquer compromisso para um futuro incerto e muito provavelmente demasiado tardio.
É impossível não apontar para o descrédito da ONU com este processo, apesar de todo o esforço que fez para mostrar tal cimeira como mais um passo dado no combate às alterações climáticas. No entanto, o que se demonstrou foi o recuo em vários dossiers, ausência escandalosa de compromissos e o adiamento de quase todas as decisões.
Assim, Cancún é o falhanço total, ao insistir na resolução da crise climática pela via do mercado e do capitalismo, repleto de esquemas e pressões em negociações sem transparência e com total desprezo pelos milhares que se têm mobilizado em torno do assunto, assim como pelos cientistas que também têm produzido propostas concretas. Os documentos produzidos mais uma vez primam pela retórica mas também pela falta de concretização. Agrava-se o problema e o problema é a morte de milhões de pessoas sobretudo das classes mais desfavorecidas, essas são as mais afectadas pelas alterações que já começaram a acontecer.
Acabando como começamos: é evidente que para invertermos o rumo que este mundo leva com as várias crises estruturais - e não conjunturais como parecem muitas vezes fazer crer - que se colocam, é vital a mudança do sistema, dos princípios e das prioridades que nos regem. O capitalismo é inimigo, por natureza, do planeta e das gentes que nele habitam. A luta ambiental tem um potencial importante para colocar este em xeque.

Rita Silva

 

 

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