Maré Alta |
Quinta, 24 Março 2011 | |||
Na tarde do dia 12 de Março, centenas de milhar encheram as nossas ruas. Foi num clima de luta e alegria que ouvimos o apelo de todos que não aguentam tanta precariedade, que não suportam mais as suas vidas suspensas. Esta foi muito mais do que uma manifestação de uma “geração à rasca”, foram várias gerações que fizeram ecoar pelas ruas, em uníssono, gritos de insatisfação apelando à mudança urgente. São os cidadãos que confrontados com dificuldades, muitas de necessidades extremas, a exigem. Este é o apelo de toda uma sociedade, uma sociedade em sacrifico para que seja garantida a continuidade deste sistema injusto e flagrantemente desigual. Encheram as ruas várias gerações, desde os mais novos, que perdem a esperança de alcançar um futuro, aos pais e avós da geração que está a agora a ser fustigada por políticas laborais totalmente ausentes de proteccionismo. A voz multi-geracional fez-se ouvir nas ruas de várias cidades portuguesas e algumas europeias. Façamos então uma análise às respostas que foram dadas à aclamação deste descontentamento. Por parte dos respeitáveis interlocutores da opinião pública portuguesa, é apresentado o factor culpa. Depois de terem culpabilizado os pais dos jovens que não encontram um lugar estável no mercado de trabalho, culpam agora os próprios jovens, acusando-os de inércia e inadaptação à realidade. Apresentam-nos como soluções a emigração ou o empreendedorismo. Pois bem, a emigração que servirá aos interesses da máquina capitalista globalizada é uma desistência do futuro do nosso país. A qualificação destes jovens e a abertura para a sua correcta aplicação é uma das respostas que o país necessita para o progresso. Insólita a questão do empreendedorismo! Com isto querem-nos dizer que os jovens deveriam criar as suas empresas desvinculando o estado da responsabilidade de elaboração de políticas de criação e protecção de emprego. Se juntarmos os trabalhadores precários e os desempregados não temos país para tanto empreendedorismo! Sabemos que a criação de novas empresas favorece, uma vez mais, os interesses lucrativos da banca e a subsistência de pequenas empresas é na maioria das vezes inviável. Qual a resposta do nosso governo? José Sócrates e Teixeira dos Santos preferem deixar a população portuguesa sem reposta ao seu apelo de políticas sociais mais justas e, não escondendo a sua subserviência a Ângela Merkel, apresentam um novo plano de austeridade para “defender” a economia do país. Temendo mais as reprimendas europeias do que a voz popular chamam os mesmos de sempre a pagar a factura de uma gestão ruinosa. Uma vez mais José Sócrates desmente garantias dadas anteriormente e, reforçando a ameaça sobre os trabalhadores, apresenta neste PEC IV que a redução das indemnizações será válida para todos os trabalhadores aplicando-se não só aos futuros contratos de trabalho mas também aos actuais. Enquanto nas ruas ecoam os apelos ao fim da precariedade, o nosso governo insiste em desproteger cada vez mais os trabalhadores com a aplicação de medidas que em nada favorecem a economia do país, apenas os interesses do grande patronato. Façamos por último uma análise ao que o PSD tem para apresentar como resposta a este apelo. O partido que não soube respeitar a vontade dos organizadores e se “colou” ao protesto, para projecção política, fazendo-se representar por membros da juventude social-democrata distribuindo propaganda do seu próprio partido. Será que Passos Coelho compartilha da falsa compaixão “carinhosa” que Miguel Relvas dizia sentir pela manifestação? Provavelmente sim! O seu “carinho” está, no entanto, mais concentrado nas gerações futuras para as quais pretende aumentar exponencialmente a precariedade e reduzir a sua qualificação académica. Passos Coelho prefaciou um manual com indicações de como governar Portugal, ao qual eu gentilmente sugiro um título: “Manual para governar um país para totós – dicas para cada um dos dias do ano”. Neste manual, onde 365 ideias foram compiladas por um dos conselheiros económicos de Passos Coelho, são apresentadas as propostas dos donos da economia nacional. Estas são ultra-liberais e retiram o estado de qualquer responsabilização social mas são as medidas que o número um do PSD apoia como solução para o país. A aposta no ensino privado e o afastamento do estado da educação não permitirá que a gerações futuras tenham acesso ao ensino de igual forma. Far-se-á uma triagem mais apertada dos que terão acesso ao ensino por razões económicas. Para a precariedade Passos Coelho apoia políticas de mais precariedade com a total flexibilização do mercado laboral e facilidade de despedimentos. A posição da direita é marcante e clara, PS, PSD e CDS não apresentam soluções que defendam o interesse dos cidadãos, cada vez mais as políticas de direitos sociais são anuladas e o estado social destruído. A população está a reagir contra estas medidas. A esquerda tem agora uma oportunidade para fazer sentir a sua força. É notório que estamos a assistir a alterações notáveis no comportamento da sociedade, a força popular está unida pela vontade e necessidade de mudança. É urgente canalizar esta força para respostas eficazes, temos de anular o abismo social que sulca o nosso país. Não estamos a remar contra a maré pois a maré está-se a levantar. A população está a sair à rua, ganhou voz na comunicação social e fenómenos marcantes de contestação estão a acontecer. As nossas políticas são a resposta para este apelo de mudança. Vamos continuar a dar força a esta luta! Odete Costa
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A Comuna 33 e 34
A Comuna 34 (II semestre 2015) "Luta social e crise política no Brasil" | Editorial | ISSUU | PDF
A Comuna 33 (I semestre 2015) "Feminismo em Ação" | ISSUU | PDF | Revistas anteriores
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