Reminiscências do Fascismo Versão para impressão
Quarta, 08 Agosto 2012

reminiscências do fascismo

Privatizar Portugal tem sido o caminho traçado para uma hipotética reestruturação do país com vista ao fim da crise. Sabem-no eles, e sabemos nós, que o país não sairá mais forte nem recuperará da crise com privatizações que tornam o estilo de vida mais elementar, insustentável economicamente, promovem o desemprego e a miséria.

A redução dos serviços públicos de saúde com os crescentes cortes orçamentais, fecho de hospitais e centros de saúde e avanço de hospitais e clínicas privadas ou público-privadas leva a um aumento significativo dos custos dos serviços de saúde pelo aumento das taxas moderadoras de forma substancial. Também a comparticipação em despesas medicamentosas tem vindo a ser reduzida de forma drástica. Num panorama de desemprego nacional, cortes salariais e cortes nas pensões não se torna difícil antever que, sem outra alternativa, a população se veja obrigada a evitar cada vez mais recorrer aos serviços de saúde optando pela auto-medicação com todos os riscos que esta envolve. Sem dinheiro para cuidados médicos e diagnóstico, a doença terá uma mancha de expressão cada vez maior e talvez venhamos a assistir a uma maior mortalidade por falta de cuidados adequados de saúde, de diagnóstico e assistência na doença. A longo prazo (ou talvez não assim tão longo) só terá acesso à saúde quem tiver recursos económicos ou seguros de saúde consequentemente a maioria da população será privada de assistência médica.

Com menos hospitais e menos centros de saúde, as listas de espera, já tão longas, avizinham-se intermináveis com consequências terríveis para os utentes para não falarmos também no desemprego dos profissionais que prestam serviço nesta área e que ver-se-ão impossibilitados de trabalhar assistindo à sua volta a enfermidade sem tratamento. Teremos de um lado profissionais de saúde que querem trabalhar, noutro a população doente que necessita e deseja assistência e entre ambos a ganância e falta de consciência do governo que impossibilita a cura e o tratamento pela imposição de montantes difíceis de pagar e destruição de recursos e equipamentos.

Também na educação o panorama tem sido negro, fecham escolas, creches, infantários e ATLs, as propinas aumentam e tornam-se um pesadelo para a qualificação dos jovens que vêm o seu percurso académico ameaçado ou mesmo arruinado por impossibilidade de pagamento. Resultará, destas medidas dramáticas de fuga à responsabilidade social por parte do nosso governo, um futuro com uma população pouco qualificada, já que, com pais desempregados, custo de vida elevado e impossibilidade de arranjar emprego, os jovens terão poucas alternativas ao arrumar de cadernos e livros.

Os transportes também se têm privatizado o que tem levado a uma escassez de serviços, passes com montantes exorbitantes, a uma dificuldade de deslocação e ao isolamento. Sem transportes para ir ao médico, à escola ou ao emprego isolam-se populações e promove-se o retrocesso do país em grande escala.

Para além das creches que fecham, fecham igualmente os lares de idosos públicos restando os privados que quase ninguém na actual conjuntura económica tem possibilidade de sustentar, nascem lares ilegais e abandonam-se os idosos à sua sorte esperando uma morte solitária e sem assistência alguma.

É este o panorama português que o governo tem desenvolvido. Um Portugal que, a passos largos, se tem assemelhado ao Portugal de outros tempos que o 25 de Abril queria destruir. A população que necessita de cuidados está cada vez mais desamparada, as crianças precisam que alguém cuide delas, tal como os doentes e os idosos mas as portas fecham-se e as soluções começam a ser quase nenhumas. Aqui reside o perigo para as mulheres que sofrerão cada vez mais a pressão social imposta por este governo e as suas medidas austeritárias, conservadoras, machistas e de direita a retornarem a casa já que têm sido as cuidadoras por excelência ao longo da história.

Posto que as mulheres têm mais dificuldade em conseguir emprego apesar de serem detentoras de mais qualificação e considerando que os seus ordenados são inferiores aos auferidos pelos homens no desempenho das mesmas funções será bastante fácil empurrá-las para o domicílio. Perdem a autonomia financeira e passam a depender economicamente de outros, perdem a voz social e política, ficam presas ao isolamento e a violência doméstica torna-se mais fácil de exercer e perpetuar, avança a anulação social das mulheres e o avanço civilizacional das últimas décadas fica em risco de um retrocesso muito significativo aproximando-se em larga escala ao vivido em tempos de fascismo. O impacto das privatizações nas mulheres é muito superior a qualquer outro grupo social. As mulheres são as mais vulneráveis. Fica assim, a mão-de-obra mais qualificada afastada do mercado laboral para prestação de cuidados em casa até ao dia em que se achará que é desperdício investir na sua educação.

Se o permitirmos, com o tempo teremos recuado ao ideal das mulheres submissas, silenciadas, que cuidam do lar e da família, obedientes e discretas. Abre-se um campo de violência e perdem-se os direitos conquistados. É o quadro do capitalismo e da clausura feminina. A igualdade de género não terá então passado de uma utopia.

Para as mulheres, estas privatizações são uma séria ameaça à igualdade de género e à sua humanidade. Num país onde para se ter direito à vida há que ter uma carteira recheada desafia-se toda a conceção de humanidade e direitos sociais conquistados até aqui e relembram outros tempos negros que julgávamos já ultrapassados. Trememos tod@s, tremem mais as mulheres.

Temos de tomar medidas para que tal não aconteça e a tomada de consciência individual e coletiva, bem como a luta social são essenciais para travar esta catástrofe humana e histórica.

Nádia Cantanhede


 

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