Fim da Monarquia Espanhola? Versão para impressão
Segunda, 02 Junho 2014

anti-monarquiaO monarca do Estado Espanhol Juan Carlos abdicou, a 2 de maio, e pretende que se iniciem o processo sucessório. Um novo rei para unir o Estado Espanhol é o contra-golpe dos conservadores perante um cenário em que as contradições sociais e nacionais se agudizam.

 

Artigo de Bruno Góis

 

#APorLaTerceraRepublica ou #RepúblicaCatalana #‎RepúblicaGalega #‎EuskalErrepublika ... ?

 

Foram imediatamente marcados protestos cidadãos por um referendo Monarquia/República, exigência feita também pela Esquerda Unida e pelo Podemos, e ainda as forças nacionalistas, nomeadamente as de esquerda, estão a convocar protestos pela criação das suas próprias Repúblicas. Aquela decisão do rei não pode ser vista fora do contexto do avanço das forças de esquerda ao nível estatal e dos prenúncios de colapso do atual Estado Espanhol, principalmente com o avanço das forças políticas independentistas da Catalunha e do País Basco. Com resultados menos expressivos, mas dignos de nota, está o independentismo na Galiza - este apenas com expressão à esquerda e com muita força no movimento sindical.

 

Indicador/Catalisador das Europeias 2014

 

As recentes eleições europeias podem ser barómetro e/ou catalisador de todos estes processos. A hegemonia do centro não foi totalmente quebrada, mas saiu em estado grave desta luta eleitoral. O PP continua a ser a força política mais votada com 26,05 % e 16 eurodeputados/as, no entanto fica longe dos 42,12 % de votos e 24 eleitos/as de 2009. O PSOE foi o mais prejudicado dos dois, com 23% e 14 eurodeputados/a, também longe dos 38,78 % de votos e 23 mandatos de 2009 .

Destaca-se principalmente a ascensão com 9,99%, 1.555.275 votos, (3,71% em 2009) da Esquerda Plural, coligação liderada Esquerda Unida, que conseguiu 6 mandatos: 4 eurodeputados/as da Esquerda Unida, um da Iniciativa per Catalunya Verds, e uma eurodeputada da ANOVA-Irmandade Nacionalista galega. Ou seja, maioritariamente defensores/as de uma república federal, salvo a ANOVA, onde a perspetiva da soberania galega não foi abandonada.

A recém constituída força política Podemos (inscrita a 16 de janeiro) elegeu 5 eurodeputados/as e teve 7,96 %, 1.239.133 votos, e juntar-se-ão também ao grupo parlamentar europeu da Esquerda Unitária Europeia. Nesta força política, onde tem papel de relevo a Esquerda Anticapitalista e a busca de novas formas de fazer política reivindicadas pelas mobilizações populares, é dúbia a posição sobre as reivindicações emancipatórias das chamadas nações periféricas do Estado Espanhol. Embora se leia no seu programa "Ampliación y extensión de la fgura del referéndum vinculante, también para todas las decisiones sobre la forma de Estado y las relaciones a mantener entre los distintos pueblos si solicitaran el derecho de autodeterminación" (p. 8) e a Esquerda Anticapitalista tenha já cartazes a dizer "República" (no singular) e "direito a decidir" (autodeterminaçao dos povos).

Na Catalunha, destaca-se a eleição de 2 eurodeputados da lista liderada pela ERC (Esquerda Republicana Catalã), que se converteu na força mais votada ao nível do seu círculo com 23,67% (9,2% em 2009), tendo ficado em segundo lugar outra formação nacionalista, a de direita, a CiU (Convergência e União) que teve 21,86% (22,44%, em 2009). As forças políticas contrárias à autodeterminação da Catalunha  (PSC/PSOE, PP e Ciutadans) somadas representam apenas 30 % dos votos catalães. Pelo que há perspetivas favoráveis a uma maioria pela independência catalã no referendo que as forças soberanistas catalãs pretendem convocar para 9 de novembro deste ano.

A candidatura "Os povos decidem" liderada pela força nacionalista de esquerda basca Euskal Herria Bildu (EH Bildu)e pela frente nacionalista Bloque Nacionalista Galego (BNG) conseguiu eleger um mandato, cujo tempo será repartido entre ambas à proporção dos votos. No País Basco, ou Euskadi, o EH Bildu teve 23,35%dos votos e foi a segunda força política, atrás do Partido Nacionalista Basco (PNV, de direita, com 27.45 %). Na Galiza, o BNG teve 7,90 %, e foi a quinta força politica.

Note-se ainda, em sentido contrário, a ascenção de outras forças como União Progresso e Democracia (UPyD) (6,49%, 4 eurodeputados/as) e Cidadãos (3,16%, 2 eurodeputados/as) que querem fugir à dicotomia esquerda-direita e pugnam com grande hostilidade contra as reivindicações das nações periféricas, defendendo um nacionalismo/patriotismo espanholista e fazendo do anticorrupção o centro da sua política.

É certo que foram apenas 45,85 % de eleitoras e eleitores que compareceram perante as urnas do Estado Espanhol para votar nas europeias 2014, é certo também que esse valor está acima do cenário geral de abstenção nestas eleições europeias nos vários Estados Membros.

 

O que representaria o fim da Monarquia Espanhola?

 

A restauração da monarquia espanhola com Juan Carlos foi uma herança quer do franquismo (foi escolhido pelo ditador Francisco Franco para seu sucessor), quer da transição tutelada de 1975 que impediu irrupções de emancipação social e nacional. Com a monarquia permaneceram intocadas estruturas e elementos do aparelho de Estado que fizeram a transição para o sistema da Constituição de 1978. Nem todos os partidos foram imediatamente permitidos e a questão das nações periféricas ficou congelada na mera autonomia regional reconhecida às "nacionalidade históricas". Ficaram os povos presos na formulação do artigo 2: "La Constitución se fundamenta en la indisoluble unidad de la Nación española, patria común e indivislble de todos los españoles, y reconoce y garantiza el derecho a la autonomía de las nacionalidades y regiones que la integran y la solidaridad entre todas ellas."

Além da questão nacional, as relações com a Igreja Católica e a continuidade de uma estrutura militar/policial/jurídica marcada pelo regime anterior são elementos que podem ser superados por processos de ruptura com a monarquia. Acresce que a representação que PP, PSOE e o aparelho de Estado fazem dos grandes interesses económicos das burguesias espanhola e europeia, com a submissão à Europa da Troika e da Banca, também poderão ser postos em causa pela efervescência de processos democráticos com reivindicações de transformação social.

Todos estes processos devem ser seguidos com atenção e militância, pois como bem disse Alberto Matos nos 580 dias que mudaram Portugal: "já que o Capital está a fundir os nossos destinos, também o processo da revolução socialista em Portugal se entrelaça ainda mais com a luta da classe operária e dos povos europeus, em particular com os das restantes nações ibéricas".

Bruno Góis

 

 

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