Uma volta de 360 graus que nem se iniciou Versão para impressão
Quarta, 04 Novembro 2009
O cenário de guerra parece uma constante no futuro do Afeganistão. Os atentados não voltarão a manchar de sangue os boletins de voto embora não pareça que o sangue afegão vá parar de jorrar  vítima da ocupação estrangeira e da tirania interna. No entanto as vidas perdidas e a marcha contínua dos processos sobre os corpos tem tido um efeito positivo.
Artigo de Ana Cansado

No Afeganistão já não se irá realizar a segunda volta das eleições presidenciais, porque perante o abandono de Abdullah Abdullah a Comissão Eleitoral cancelou as eleições e declarou Karzai presidente. Uma coisa é certa, o ambiente que envolveu as anteriores eleições degradou-se ainda mais e a constatação de fraude, sem punição, nem alteração dos agentes fraudulentos, não augura transparência ou verdade.

Desde 2001, os Estados Unidos mantêm no Afeganistão a operação Liberdade Duradoura apoiados pela missão de segurança e desenvolvimento da ISAF (Internacional Security Assistance Force) comandada pela NATO com a intenção de assegurar a paz e promover a democracia. No entanto, quer a UNAMA (United Nations Assistance Mission in Afghanistan), quer outras agências que têm o dever de informar sobre a situação, reportaram, nos últimos oito anos, a degradação da vida no Afeganistão, o empoderamento dos Talibans e de outros senhores da guerra, assim como um aumento significativo do tráfico de drogas. Os números fornecidos informam que o número de mortos civis e de efectivos militares tem vindo a crescer e que, só no primeiro semestre de 2009, morreram cerca de 1300 afegãos, homens, mulheres e crianças, que tentam sobreviver ao caos que se apoderou do seu país.

Este cenário de guerra parece uma constante no futuro do Afeganistão. Os atentados não voltarão a manchar de sangue os boletins de voto embora não pareça que o sangue afegão vá parar de jorrar  vítima da ocupação estrangeira e da tirania interna. No entanto as vidas perdidas e a marcha contínua dos processos sobre os corpos tem tido um efeito positivo. Cada vez mais a opinião pública se interroga sobre o caminho a seguir. E não é apenas a opinião pública. De acordo com um artigo publicado recentemente no Washington Post, o Capitão Matthew Hoh, oficial sénior dos EUA no Afeganistão demitiu-se por não mais acreditar na motivação nem no objectivo da presença dos soldados americanos no Afeganistão. Nem as tentativas diplomáticas, nem o assédio do governo para que Hoh assumisse outras funções junto do governo norte americano foram suficientes para que este continuasse a emprestar o seu nome para apoio da política externa americana. A caracterização que é feita deste homem não me permite considerá-lo um rebelde ou um revolucionário. Pelo contrário Matthew Hoh surge como um patriota, um Marine típico, mas que perante a situação concreta não reconhece no Afeganistão a missão dos Estados Unidos da América.

O New York Times publicou um artigo, onde Ahmed Karzai, irmão do candidato Hamid Karzai, é identificado como o senhorio das Forças Especiais do exercito americano que partilham um complexo de edifícios, que costumava albergar o Mullah Omar, com outro inquilino, o grupo mercenário a 'Força de Ataque de Kandahar' que opera sob a direcção da CIA. A CIA também pagava a Ahmed Karzai para que este ajudasse a recrutar elementos para a força paramilitar que gere. Ahmed Karzai é ainda suspeito de promover o tráfico de ópio. Estas revelações ajudaram também a agitar as consciências e no governo de Obama há quem questione o mérito de apoiar Hamid Karzai quando este se prontifica a proteger o irmão de qualquer tentativa de afastamento por partes dos americanos. No terreno, o Major General Michael T. Flynn, oficial sénior de segurança e informações, disse que era um tiro no pé continuar a passar a imagem de que as forças americanas apoiam bandidos e que era preciso mudar a estratégia pois e como próprio disse “The only way to clean up Chicago is to get rid of Capone,” ( A única maneira de limpar Chicago é acabar com o Capone).

Recentemente tive a oportunidade de ouvir de viva voz Malalai Joya, activista da luta pela democracia e direitos das mulheres no Afeganistão, ex-deputada afegã, que confirma o horror que actualmente domina o seu país, a corrupção dos políticos afegãos e dos militares americanos que ajudam a manter no poder os senhores da guerra que perseguem interesses pessoais e ferem o povo Afegão. A coragem e resistência de Malalai são admiráveis. Ela fez apenas um pedido à audiência. Vejam o que realmente se passa no Afeganistão. Sim os Talibans são maus, os senhores da guerra perigosos mas o exército de ocupação não está a ter sucesso no combate a estes e é mais um entrave à luta dos afegãos que lutam pela democracia e querem paz. Malalai pede a retirada das tropas estrangeiras para que os afegãos tenham uma hipótese de lutar pela democracia e pelos seus direitos. Quanto a Obama Malalai pede-lhe que peça desculpa pelos 'erros' e pelo sangue afegão inocente que as tropas americanas fizeram correr.

Não é possível transformar o estado das coisas no Afeganistão rapidamente. Cancelar as eleições foi um acto cobarde de quem teve medo de que a maioria dos votos não viesse legitimar a vitória na secretaria obtida por Karzai. Este não é o caminho da democracia. A reeleição de Hamid Karzai não resulta na esperança que daí venha a paz e o progresso que o povo Afegão espera e merece. Esperemos que a comunidade internacional reflicta sobre o mérito das missões no Afeganistão e que o governo americano pondere seriamente se este o caminho para a Paz.

Artigo de Ana Cansado

 

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