A bem da nação!? Versão para impressão
Segunda, 26 Outubro 2009
Qual o significado da votação dos eleitores portugueses no último dia 27 de Setembro? A políitca neo-liberal no governo com maioria absoluta foi derrotada. Mas a política neoliberal praticada pelo PS recebeu ainda assim o voto necessário para prosseguir no governo mas apoiada numa maioria relativa. Os partidos das políticas neolibeais – PS, PSD e CDS – receberam ainda o voto maioritário dos portugueses.
Artigo de Mário Tomé

Com a brutal crise internacional o neoliberalismo sofreu uma derrota ideológica – ficou desmacarada a sua face sevandija e selvagem escondida até então sob a capa da liberdade individual e da liberdade e prosperidade ligadas à liberdade sem peias do mercado.

Os partidos responsáveis pelas políticas neoliberais desde os anos oitenta, nomeadamente os PS's, que perderam ao mesmo tempo que a vergonha o mínimo cheiro de social democracia, viram-se obrigados a criticar em palavras as políticas que praticaram e continuam a praticar.

O PS e o seu Governo representam o desenvolvimento da privatização do que só poderia ser público; a desregulamentação  das relações de trabalho, o fim (!) do emprego, anunciado no auge do cavaquismo, criticado pelo PS e logo adoptado por ele da mesma forma que reviu o código Bagão Félix em alta; o processo de Bolonha alienando os supremos valores da cultura, do saber e da formação  humanista e cidadã aos interesses imediatos da produção capitalista e da especulação financeira de que fez parte a agressão aos professores; a privatização da saúde e preparação do assistencialismo «misericordioso»  para a generalidade dos que não podem pagar; a falsificação dos termos da relação com os cidadãos ao faltarem à promessa de sujeitarem o Tratado de Lisboa a referendo da mesma forma que o PSD; o apoio patrioticamente ridículo a Durão Barroso o mordomo dos EUA na Europa; o persistente  amor à  NATO, num contorcionismo deselegante da Constituição, insuperavelmente representado pelo ministro Luís Amado, passando por uma crítica  inconsequente à agressão ao Iraque (que Amado aliás apoiou e Lamego aproveitou) mais o contributo para a guerra do Afeganistão à espera que os EUA sejam obrigados a «dar às de Vila Diogo» para, numa confissão uma vez mais vergonhosa de que nada somos para além do que eles impõem, anunciarmos patrioticamente que o melhor é retirar as tropas do apoio aos traficantes de droga;  «and so on» como deve ser dito.

Nas chamadas questões fracturantes  -  aborto, casamento homosexual, divórcio por decisão de um dos cônjuges e outras - que  nada têm de fracturante, dado que são aceites por qualquer burguês «a la page», o PS apenas no aborto se abalançou a uma posição sem reticências. De resto ajudou a encanar a perna à rã.


Na generalidade das opções  políticas com concretização legislativa o PS alinhou e contou com o PSD, habituados que estão um ao outro há mais de vinte anos.

Por isso, quando se fala em «estabilidade governativa» como objectivo sobranceiro só se pode estar a incentivar um acordo PS/PSD ou a fazer eco da estratégia do PS de tentar atribuir, aos que têm políticas alternativas, uma estranha responsabilidade de não aceitarem sustentar as políticas que perderam força e credibilidade na sua expressão governativa.

Um já vasto número de cidadãos e cidadãs cromprometidos claramente com uma alternativa de esquerda para o país conjugam os seus esforços num apelo sincero e certamente ponderado para uma solução que garanta a famosa «estabilidade governativa» através da convergência de esforços dos partidos de esquerda. Ou seja, na sua opinião, o PS, o BE e o PCP/CDU.

Propõem uma solução pluripartidária com aqueles partidos, susceptível de encontrar resposta aos factores de crise e desigualdade social lembrando os acordos que noutros países da Europa Ocidental são muito comuns, citando a França, a Itália, a Suécia, a Dinamarca, a Finlândia, etc.
E lembram que há mais de 30 anos as forças de esquerda se têm mostrado incapazes de gerarem soluçãos de governo e que isso tem contribuído para o desfasamento entre os eleitores que querem o entendimento e os eleitos que persistem na incomunicabilidade.

Eis uma abordagem da governabilidade que fará as delícias do deputado Marques Perestrelo (ouvi-o ontem no «Corredor do Poder» da RTP1 defender que os deputados e partidos passaram a ter que defender uma política nacional – a cargo certamente do partido mais votado!, já que, digo eu, o professor Marcelo Caetano, já cá não está) e da generalidade dos socialistas neoliberais que têm governado o país.

A responsabililidade de assegurar a governabilidade pertenceria, portanto,  às forças de esquerda (BE e CDU) que se apresentaram como alternativa às políticas que o PS tem levado por diante com o apoio «crítico» mas efectivo e eficaz do PSD e do CDS. É esquecer  que tais forças  foram apoiadas e escolhidas para representar mais de um milhão de cidadãos e cidadãs exactamente para confrontar as políticas neoliberais  que parece  já se poder admitir serem de esquerda ou ser de esquerda quem as levou e jura continuar a levar por diante.

Não parece sensato pensar que quem escolheu na hora do voto o tenha feito com a exigência de um acordo das «esquerdas» quando a maior «delas» acabou de deixar o país como se sabe, e se sente, com o apoio, repito, da direita.

Embora não pareça plausível, se o PS está na disposição de arrepiar caminho, por inspiração do Espírito Santo que parece não estar para aí virado mas mais para os 4,5% do CR9,  nem é preciso qualquer abaixo assinado: teremos o Código Bagão Felix/Vieira da Silva suspenso, suspensa a avaliação burocrática e estupidificante dos professores, teremos subsídio digno de desemprego para todos os desempregados, pensões dignas, travado o processo de parcerias com os Mello na saúde e o reforço do serviço público,  teremos o apoio às Universidades, as proprinas  tendencialmente gratuitas, a aposta nos serviços públicos de transportes,o fim do sigilo bancário, a aprovação das leis anti-corrupção, a taxação das mais valias bolsistas e dos altos rendimentos dos mais ricos para sustentar a segurança social, etc.e não será preciso perdermos tempo com compromissos. Lá estaremos para apoiar tão elementares medidas de esquerda.

O compromisso da esquerda é com o povo.

O apelo à estabilidade governativa, assinado por tantos e tantas personalidades que terão certamente um enorme contributo a dar na gestação de uma alternativa de progresso às políticas que PS e PSD têm imposto ao país , (separados e até formalmente juntos) desde há mais de trinta anos – não será por isso que os entendimentos das «esquerdas»  têm sido impossíveis? - apenas leva a água ao moinho do PS.

António Costa também conseguiu ganhar com o apoio de muita gente que nada tem a ver com a política com que o representante de José Sócrates irá dirigir a CML de Lisboa . Mas o caminho não será por aí.

De facto, há trinta anos que as pessoas mais bem intencionadas do mundo fazem apelos semelhantes a este. Para, quiçá, evitar o corte que terá de ser feito com toda uma concepção tradicionalmente aceite sobre a esquerda, concepção essa que escamoteia a insensibilidade social  e a inevitabilidade das políticas impostas pelo complexo financeiro com a retórica democrática e republicana.

O 25 de Abril teve a bondade, entre outras, de mostrar não só as insuficiências da esquerda que, aliás, alguns sectores têm feito tudo para  alterar radicalmente, como o BE, por exemplo, e para deixar a nu a mistificação da social democracia deglutida ingloriamentge pelo neolioberalismo e agora, em fase de derrocada ideológica, tentando surgir como alternativa a si própria.

Este tipo de iniciativas por mais bem intencionadas que sejam apenas servem para arrastar o moribundo retirando-lhe a pouca dignidade que lhe poderia restar.

A causa da esquerda exige responsabilidade perante os cidadãos e perante a confiança que nela depositaram. A governabilidade é uma mistificação se não corresponder às necessidades dos portugueses e do país, enquanto entidade onde convivem e conflituam interesses por vezes antagónicos. Cada vez menos a amálgama é possível.

Há de facto que escolher.

Entre ajudar o PS a governar para os seus credores - a banca, a finança, o imperialismo; ou construir uma alternativa que, com saber e prudência mas com a radicalidade necessária responda aos que sofrem os  efeitos duma crise que não provocaram e são obrigados a pagar aos criminosos que continuam pelo mesmo caminho impunemente.*

Artigo de Mário Tomé

 


* Tudo pelo melhor nas bolsas; ou sobe, sobe, balão sobe
O índice Dow Jones quebrou ontem a "barreira psicológica" dos 10 000 mil pontos. Eles querem agora voar aos picos de 2007 (14.000). A exuberância irracional voltou.
Está a chegar muito dinheiro às bolsas de todo o mundo. Mas significa isto que está a haver muito investimento - daquele que cria emprego e gera rendimento? De forma nenhuma. O que está a chegar às bolsas é dinheiro que inflaciona o valor de activos já existentes e aumenta apenas a riqueza de quem os detém e dos que os transaccionam.
Mas a "indústria" financeira alimenta-se disto e dos milhões públicos. Como se vê traz-nos a todos reféns. Apesar de muito palavreado a normalidade exuberante está a regressar à finança. Más notícias.

Publicada por José M. Castro Caldas em Ladrões de Bicicletas 

 

 

A Comuna 33 e 34

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A Comuna 34 (II semestre 2015) "Luta social e crise política no Brasil"EditorialISSUUPDF

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