O imposto. Qual imposto? Versão para impressão
Terça, 02 Junho 2009

A campanha para a eleição do Parlamento Europeu tem tido uma agenda variada, repartida entre problemas nacionais e questões de personalidade típicas deste processo, mas não tem deixado de levantar alguns temas relativos às especificidades da Europa que permitem alguma reflexão sobre o Projecto Europeu.

Artigo de Ana Cansado

O cabeça de lista do Partido Socialista (PS) alvitrou a hipótese de aumentar os recursos da União Europeia através da criação de um imposto europeu sobre transacções financeiras ou pelo aumento das contribuições dos orçamentos nacionais. Aparentemente está preocupado com o reduzido orçamento da União Europeia, com uma melhor redistribuição, recusando que a via para a concretização destas hipóteses seja um aumento da carga fiscal sem no entanto concretizar uma proposta.

O orçamento da União Europeia é financiado pelos recursos próprios da União que são obtidos através dos direitos aduaneiros, dos direitos agrícolas, de uma taxa aplicada à base harmonizada do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e de uma taxa aplicada ao rendimento nacional bruto (RNB). Para além dos recursos próprios, é também financiado pelos impostos e taxas cobradas sobre os rendimentos do pessoal, por juros bancários, pelas contribuições dos países terceiros a certos programas comunitários, reembolsos de ajudas comunitárias não utilizadas, juros de mora e ainda pelo saldo do ano anterior.

864.363 milhões de euros pode parecer uma valor elevado mas para financiar as políticas europeias inscritas no quadro orçamental da União Europeia para o período 2007-2013 é claramente insuficiente pois a maior parte desse dinheiro cobre apenas as despesas administrativas e dos programas comunitários regulares deixando de fora certas prioridades, nomeadamente de política social.

A política fiscal deve almejar a justiça fiscal como um meio para alcançar a justiça social. Qualquer proposta que surja deve privilegiar os impostos directos (que incidem sobre os rendimentos e onde se pode exigir mais a quem mais recebe) e não os indirectos (que incidem sobre o consumo e as transacções).

O imposto sobre as grandes fortunas, já experimentado nalguns países europeus - como Espanha, França, Alemanha, e ainda em vigor na Finlândia, no Luxemburgo, na Holanda, na Áustria, na Suíça e na Suécia - e que o Bloco de Esquerda (BE) tem tentado implantar em Portugal, seria um mecanismo de financiamento melhor que aqueles que constituem os actuais orçamentos nacionais e que provavelmente poderia ser harmonizado de modo a aumentar o orçamento europeu. Se esta era a ideia de Vital Moreira devia tê-la discutido com o partido que suporta a sua candidatura pois no Parlamento nacional o PS tem rejeitado sucessivamente esta via de justiça fiscal.

O imposto sobre as movimentações financeiras internacionais de carácter especulativo não é uma ideia original de Vital Moreira. Este imposto é mais conhecido como Taxa Tobin e seria um imposto incidente sobre o valor das transacções financeiras de curto prazo que deveria variar entre 0.1% e 0.25% e, embora pareça muito limitado, faria uma verdadeira revolução nos sistemas fiscais. As instituições europeias, que se apressaram a salvar as instituições financeiras quando estas regressaram quase falidas da sua ida ao casino, deviam pensar em aplicar um imposto aos jogadores (especuladores bolsistas) em vez de usar o dinheiro de todos nós (IVA/RNB) para pagar as dívidas de alguns.

Deste modo, embora seja um imposto indirecto, seria aplicado a transacções que reflectem um sinal exterior de riqueza pois, quem tem um rendimento limitado não brinca nem joga com o rendimento disponível para sobreviver.

Miguel Portas, cabeça de lista do BE rejeita a sugestão de Vital Moreira e afirma que as propostas do Bloco não passam por um novo imposto que recaía sobre todos os europeus. Para aumentar os recursos da Europa diz Miguel Portas que é preciso ter "a coragem política de ir buscar o dinheiro onde ele existe e acabar com os paraísos fiscais" onde está depositado, livre de qualquer imposto, cinco vezes mais dinheiro do que o conjunto dos planos norte-americano e europeu contra a crise e defendeu ainda "que se taxem todas as transacções, todas as compras e vendas de títulos e produtos financeiros de acordo e em função da sua natureza".

Uma candidatura ao Parlamento Europeu como a de Vital Moreira que sugere um imposto mas apenas o descreve após a eleição, sem que o PS tenha a coragem para clarificar as opções sugeridas pelo seu cabeça de lista, é preocupante pois sugere um futuro de maior carga fiscal para todos os europeus.

Felizmente a candidatura do BE tem propostas concretas e corajosas. Os candidatos do BE assinaram um compromisso eleitoral onde declaram: "Somos, portanto, europeístas de esquerda: socialistas na proposta e solidários na atitude. Chegou a hora dos de baixo enfrentarem a crise unidos. Os pobres, os jovens, o mundo do Trabalho, a Cultura e a Ciência, precisam de uma Europa que devolva a esperança. Esta é a candidatura que quer traduzir essa aspiração".

Cabe-nos a nós europeus, que queremos uma Europa mais justa e mais solidária, ter a coragem de votar em propostas concretas. Votar no BE é dizer sim à Europa, a uma Europa democrática onde as pessoas contam, onde as instituições servirão os povos e não as instituições financeiras onde os deputados eleitos são representantes das nossas escolhas informadas . 

Ana Cansado

 

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