A quem interessa o PEC |
Segunda, 28 Junho 2010 | |||
Numa crítica ao nacionalismo económico propalado por List, Marx é peremptório: quando o burguês defende o proteccionismo como forma de defesa da economia nacional, como forma de ganhar um espaço etapista para o desenvolvimento industrial, como forma de harmonização e organização social, aquilo que o burguês está mesmo a dizer é que, no seu caso concreto necessita do proteccionismo para que possa enriquecer e explorar. Apenas necessita de esconder o seu interesse de classe por detrás de um discurso idealista. Nas palavras de Marx, “o idealismo mais não é do que o disfarce insensato e destituído de escrupulo de um repugnante materialismo”1. No caso do argumentário de List, em concreto, o idealismo burguês pretende dar uma visão humanizada e desenvolvimentista da indústria. Por isso, classifica o proletário como força produtiva e não como valor de troca, ainda que a “força produtiva seja toda ela determinda pelo valor de troca”2; por isso reclama para a indústria a educação e o desenvolvimento pessoal dos operários, a harmonização social, valores espirituais que apenas são nomeados como forma de esconder os verdadeiros impulsos materialistas que leva o burguês a apostar na indústria. A sua razão é a da traficância e a da realização de mais valia pela exploração do valor de troca que é o proletário. E assim, Marx coloca a interrogação: “Quem duvida do facto de que tudo aquilo a que hoje se chama 'virtude', virtude individual ou social, ser em benefício do lucro do burguês? Quem negará que o poder político é um instrumento da riqueza do burguês […]?3 Ainda que a discussão hoje não seja a do proteccionismo do nacionalismo económico versus livre circulação, há um paralelismo. Hoje, o burguês europeu, reclama os Programas de Estabilidade e Crescimento e as medidas de austeridade. Consegue produzir todo um discurso idealista sobre os mesmos e as suas virtudes e utiliza o poder político como instrumento de aplicação de um plano liberal-burguês que pretende delapidar o modelo social europeu e mexer nas regras e legislação laboral, permitindo-se um aumento da taxa de exploração sobre o proletariado. Nós já temos o discurso idealista dos dias de hoje: em virtude da necessidade de combate ao défice é preciso adoptar planos de austeridade para garantir a liquidez dos países e para proteger as pessoas dentro desses paises. Dizem eles. Mas o que o burguês quer mesmo dizer é que depois da crise financeira precisa de uma série de medidas para acumulação de riqueza. Daí o congelamento de salários, os cortes nas prestações sociais e o abaixamento dos direitos laborais; daí a agiotagem nos empréstimos a países em apuros, como a Grécia. O que o liberal-burguês está mesmo a querer dizer quando afirma a necessidade de um PEC é que ele tem a necessidade desse mesmo PEC. Não são os países ou os trabalhadores. É ele. Pois este é o tempo para acabar de vez com o modelo social europeu, libertando para o privado uma série de monopólios naturais que deveriam ser públicos ou uma série de serviços altamente apetecíveis, como a saúde. Por detrás do PEC está a acumulação e a maximização da taxa de exploração. Não se trata de um problema de défice ou de finanças, trata-se de um ataque político e ideológico que a burguesia quer levar a cabo para fazer pender a balanço ainda mais para o seu lado, num jogo em que o proletariado ficará completamente esmagado. Se o problema fosse o do défice dos países poder-se-ia colocar a pergunta: então e por que não taxar as fortunas, as mais valias bolsistas, os bancos com o mesmo IRC que o comércio? Por que não acabar com a roda livre do dinheiro nos off shore que servem para fuga aos impostos? Por que não? O dinheiro está aí! Mas essa taxação iria mexer nos alicerces da burguesia e em questões de propriedade. Não é o interesse do Euro, dos povos, da Europa ou dos países que está em jogo. É o interesse de uma classe que quer lançar a jogada final ao que resta de social na Europa. Artigo de Moisés Ferreira
1. Marx, Karl. (2009). Crítica do Nacionalismo Económico. Antígona. pág.66
2. Op. Cit., pág. 89
3. Op. Cit., pág. 86
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