O desperdício legislativo Versão para impressão
Terça, 22 Junho 2010

A proposta das deputadas Teresa Venda e Rosário Carneiro para transferir os feriados e eliminar pontes mereceu um consenso generalizado da bancada do partido socialista. O vice-presidente da bancada socialista Ricardo Rodrigues afirmou que Portugal está entre os países que têm mais feriados a nível mundial e considerou que a proposta tem peso económico pelo que considerou positivo que sempre que um feriado seja à quarta ou à quinta-feira possa juntar-se ao fim de semana para evitar pontes.


Artigo de Ana Cansado


Certamente haverá países que têm mais dias feriados e outros que têm menos. Uma pesquisa rápida na Internet revela que em França existem 11 dias feriados, na Inglaterra 8 dias, na Alemanha os dias feriados variam entre 9 e 13 dependendo do Land e na Áustria 16 dias feriados. Portugal tem 13 dias feriados pelo que considerar que o país se destaca a nível mundial parece-me um exagero oportunista.

É preciso pesar os interesses em causa para apreciar os eventuais méritos da proposta mas a ideia de juntar os feriados ao fim-de-semana não me parece bem pensada pois os feriados existem de acordo com tradições e correspondem a usos e práticas já consagrados que não são irrelevantes excepto se os números valerem mais que as pessoas.

A preocupação com a produtividade e com a situação económica do país é muito relevante mas é pena que as opções que vêm do governo e da bancada socialista ataquem sempre os mais pobres, os mais desprotegidos e os trabalhadores. O entendimento errado e hipócrita que motiva esta proposta é que os trabalhadores são uns malandros que fazem ponte e tudo o que podem para não trabalhar e como tal são responsáveis pela crise económica.

A direita certamente está de acordo com esta proposta. Aliás é abominável a sintonia entre Sócrates e Passos Coelho - sendo verdade que o segundo tem conseguido escapar à crítica, embora proponha o prolongamento dos contratos a prazo e medidas de despedimento mais flexíveis - tal é o descontentamento das pessoas com o governo.

Voltando à proposta das deputadas, há questões que é preciso conhecer melhor mas os dados adiantados revelam que para as proponentes é indiferente comemorar o dia 25 de Abril noutro dia sugerindo que este se passe a chamar dia da Liberdade. Esta sugestão é arrogante pois a data em que os acontecimentos ocorrem fazem parte da marca que deixam na história e o derrube do fascismo em Portugal aconteceu no dia 25 de Abril de 1974 e não no dia 24 ou no dia 26. Se 5 de Outubro não for segunda-feira corremos o risco de o celebrar no dia 4, apesar de no dia 4 de Outubro de 1910 Portugal ainda ser uma monarquia. Certamente para os feriados religiosos a data dos mesmos também terá um significado.

Pensando nas respostas à crise, o Bloco de Esquerda apresentou um projecto de lei que pretende criar um programa de apoio à reabilitação urbana. Esta proposta permite criar emprego através da melhoria do parque urbano e é parte de uma estratégia para desenvolver a economia ao mesmo tempo que interrompe os pedidos de empréstimo ao estrangeiro que agravam a dívida do país.

A proposta do Bloco não gera tantos comentários, nem tem a mesma publicidade que a proposta das deputadas da bancada do PS porque é difícil entrar no circuito informativo, quando se tem respostas alternativas às directivas das instituições financeiras internacionais como o FMI. A comunicação social faz eco da política mainstream e daquilo que é tido como politicamente correcto. O sistema capitalista está em crise mas não perdeu o ascendente sobre os governantes e sobres as instituições que continuam a prescrever receitas que não curam os males económicos e agravam a situação dos trabalhadores.

Se de facto o interesse público e o bem comum presidem às preocupações dos legisladores então é preciso dizer que propostas populistas não servem verdadeiramente os nossos interesses e é urgente defender propostas sérias para os problemas sérios que o país enfrenta. Chega de desperdício legislativo.


Ana Cansado




 

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