O mundo ao contrário Versão para impressão
Domingo, 02 Maio 2010

Neste 1º de Maio de 2010, recebemos uma excelente notícia: o governo boliviano decidiu nacionalizar as empresas de electricidade. Ao contrário do que se passa na Europa e da "normalidade" do século XXI, a pequena Bolívia decidiu nacionalizar um dos principais monopólios naturais. Muito há a aprender com este processo.

Artigo de Carlos Santos

O governo boliviano pagará aos antigos donos o valor de mercado das acções que possuíam, descontando os montantes do passivo das respectivas empresas. No fundo comprará as empresas aos capitalistas nacionais e estrangeiros, em vez de expropriar, denotando assim as limitações do processo.

Mas nacionalizou as empresas de electricidade, que passarão a ser controladas pelo poder político, eleito pelo povo boliviano. Isso é, de momento, o essencial. É um processo ao contrário do que temos vivido nos últimos 30 anos e bem ao invés do que continuamos a viver hoje na Europa.

E não esquecemos que se trata do país em que, há pouco mais de 40 anos, Guevara foi assassinado, isolado na sua batalha e incompreendido pelos camponeses. Que grande salto deu a Bolívia!

É também a prova de que, à imagem de Galileu, "ela gira". No tempo em que o neoliberalismo domina o mundo, numa parte do globo (a América Latina), há povos que decidem ao contrário, no que diz respeito à dominância ideológica, política e imperial. Isso é uma excelente novidade.

A Bolívia é um pequeno país, que está longe de ser um farol do mundo para o caminho do socialismo. Mas, é sem dúvida um país onde a ideia de que "outro mundo é possível" ganha espaço e consegue novas conquistas.

Tal como a Bolívia, diversos países da América Latina alcançaram conquistas importantes nesta primeira década do século XXI. Nuns casos conquistas mais avançadas, noutros mais truncadas, no entanto eles são o exemplo vivo de que outro mundo é possível, sem comprovarem ainda que o socialismo é possível.

Como marxistas, temos tudo a aprender com estes processos: eles provam que não estamos condenados à submissão neoliberal e que é possível e necessário mudar o sentido da roda da história do mundo. E é possível fazê-lo lutando por mais democracia e por mais participação popular, independentemente do que pensem os dirigentes progressistas bolivianos. Essa é uma vitória incomensurável sobre as velhas batalhas e referências do Che.

Como marxistas, aprendemos com as experiências da América Latina e aprendemos que também na Europa não estamos condenados às privatizações e à submissão ao poder neoliberal. O caminho para o socialismo constrói-se com experiências concretas e novas, e a vida prova que os passos na direcção da colectivização da propriedade, no caminho do socialismo, não são incompatíveis e antes pressupõem a mais ampla democracia, a maior participação popular.

A Bolívia, até há pouco um país em risco de divisão, dá um passo em frente, com democracia e pluralismo político.

Não estamos ainda a construir o socialismo do século XXI, mas as batalhas pela mudança social, comprovam que a luta pelo socialismo no século XXI exige combater a exploração capitalista, mas também elevar a democracia a um novo patamar. E a revolução é um processo bem mais prolongado e complexo, onde as conquistas sociais se fundem com as conquistas cívicas e ambientais, de onde está ausente o partido único proletário, mas onde necessitamos partidos revolucionários plurais.

Carlos Santos

 

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