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Quarta, 07 Abril 2010

Em Inglaterra nos tempos idos da senhora Tatcher as privatizações eram a flor na lapela de qualquer neoliberal que se prezasse. Foi assim que os transportes ferroviários ingleses foram privatizados. Foi assim que por toda a Europa se começou a preparar o mesmo caminho. As empresas ligadas à ferrovia foram retalhadas: infra-estruturas, manutenção, reparação, serviço comercial – cada sector para seu lado. E em Portugal não se ficou por aqui, foram criadas novas empresas, novamente retalhadas, mais unidades de negócio por tudo e por nada, mercadorias para um lado, passageiros para outro… Cada empresa com a sua Administração e com os seus prémios, a cada boy o seu quinhão.

Os passivos da CP e da Refer, nunca pararam de aumentar. À conta disto o sector financeiro rouba ao erário público milhões e milhões de euros todos os anos só em juros.

A CP, proprietária dos comboios, nunca se entendeu com a Refer, proprietária das linhas. A CP vende um serviço pelo qual não se pode responsabilizar, pois os comboios circulam nas linhas de outra empresa, as estações são da outra, as salas de espera também e por ai fora… os conflitos têm sido vários, tapados com a peneira da tutela.

Entretanto em Inglaterra os transportes ferroviários são renacionalizados. Problemas de segurança e de qualidade do serviço assim o ditaram.

Em Portugal percorreu-se todo o caminho necessário para oferecer ao capital as partes lucrativas da ferrovia. Não são parvos, porque se não tiverem garantia de lucro aplica-se a receita Fertagus. Não esquecer que o Estado, que não deixou a CP candidatar-se à exploração da linha na ponte 25 de Abril, garante ao “Barraqueiro” a quantia em falta.

Eis-nos chegados ao PEC, o Governo precisa de dinheiro, precisa de vender, está na altura de activar o plano que o bloco central vem preparando há muito tempo.

CP carga, sector das mercadorias, onde a Mota Engil do ex-ministro Jorge Coelho já mexe (Tacargo).

EMEF, manutenção e reparação de tudo o que é material circulante, única empresa detentora de Know-how capaz de responder às necessidades da CP e cuja contabilidade tem sido construída ao sabor dos interesses da proprietária CP, menos custos com a EMEF, logo menos divida.

Concessão de linhas, está-se mesmo a ver o capital privado a querer explorar a linha do Oeste ou a linha da Beira Baixa, tão bom coração eles têm…

Mas vamos ao que mais interessa: em primeiro lugar as questões sobre segurança. É, com toda a certeza, pacífico que a circulação ferroviária exige níveis de segurança muito altos, que se torna difícil garantir com vários operadores na mesma linha.

O mesmo se passa com a segurança do material que actualmente é assegurada por uma empresa (EMEF) conhecedora do material, com experiência e acima de tudo com uma percentagem elevada de estabilidade no emprego, condição fundamental para assegurar níveis de segurança condizentes com as exigências, factor que o sector privado não assegura muito menos com as actuais leis do trabalho. O Governo parece querer brincar com o fogo.

É sabido que o Estado financia o transporte ferroviário, em particular nas grandes metrópoles através do passe social e que isso conta na contabilidade das famílias. No actual contexto é impensável que este financiamento possa desaparecer ou sequer baixar, quando o que é justo é o seu alargamento. A pergunta que se impõe é se estão os eventuais privados dispostos a transportar aos preços actualmente em vigor ou se já estão de mão estendida para o Estado. O tal Estado impedidor do funcionamento da economia.

Quanto à qualidade veja-se a cobertura territorial do transporte ferroviário: abandono do interior do País, não é rentável ou há problemas na linha, a solução é o seu encerramento; fecham-se as linhas, estações, circulam os comboios com menos qualidade, menos conforto. É desinvestimento acelerado com as consequências conhecidas, um País quase todo plantado à beira-mar e o abandono de populações inteiras no interior. Este é o resultado das políticas dos governos do bloco central.

Alguém duvida que estas políticas, agora agravadas com o PEC, só levam à degradação do serviço público e à entrega aos privados de tudo o que der lucro?

O que vai fazer o Governo em relação aos elevadíssimos passivos das empresas? Os privados não os vão assumir. Pudera.

E, em relação aos investimentos previstos? 400 Milhões de euros em material circulante, renovação da linha do Oeste, do Douro, parte da Beira Baixa, ramal em Leixões, Tua, Tâmega, Corgo, oficina de Vagões da EMEF, etc. Tudo compromissos já assumidos, o que vai fazer o Governo? Mais promessas para não cumprir.

O que vai acontecer na ferrovia é o Estado ficar sem as empresas, e lá se vão os serviços públicos, mas fica também sem o dinheiro, o combate ao défice das contas por aqui não se safa.

A aposta na ferrovia, como o transporte do futuro, corre sério risco de ser uma miragem. A segurança vai diminuir, a qualidade vai diminuir, os preços vão aumentar, os direitos dos trabalhadores ferroviários vão ser retirados e o Estado fica sem os anéis e sem os dedos.

Os trabalhadores e as populações vão ter de pedir responsabilidades aos vários Partidos pela atitude e posição que assumirem neste PEC.

                                                                                                                                                                                                                     Antonio Gomes

 

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