O rosto da xenofobia Versão para impressão
Terça, 26 Outubro 2010

Angela Merkel veio recentemente a público proferir palavras de desdém pela forte presença de muçulmanos na Alemanha. Segundo a líder da CDU, "esta abordagem multicultural, dizer que vivemos lado a lado e vivemos felizes um com o outro falhou. É um modelo totalmente fracassado». Acrescentou ainda que «nós somos um país que no início dos anos 60 chamou trabalhadores do estrangeiro para virem para a Alemanha e agora eles vivem aqui connosco. Durante um tempo, mentimos a nós próprios, dizíamos que eles não iam ficar, que um dia iam partir». Estas declarações foram proferidas após a divulgação dos resultados de um estudo da Fundação Friedrich Ebert segundo o qual se estima que no território da antiga República Democrática Alemã, a percentagem de pessoas a favor de limitar as liberdades dos muçulmanos chega a 75% ao passo que 58% de cidadãos em todo o país concordam com esta medida. Merkel acusa ainda os imigrantes de comodismo, de viverem às custas do Estado optando por não procurar emprego nem estudar. Estas são críticas desprovidas de sentido visto que segundo as estatísticas o número de imigrantes a ingressar nas universidades alemãs tem vindo a crescer. Ademais, no que ao nível de desemprego entre os imigrantes toca este encontra-se dentro da média europeia. As críticas da chanceler alemã são aleatórias e sem qualquer tipo de sustentação empírica. São apenas argumentos vazios de sentido utilizados para transmitir uma mensagem também ela ilusória de que grande parte dos problemas do país se devem ao elevado número de imigrantes.

Por outro lado, Angela Merkel afirma que a Alemanha tentou preconizar um modelo multicultural. Infelizmente a noção de multiculturalismo é uma noção eurocêntrica que, ao invés de promover uma coexistência saudável de várias identidades culturais, encara as tradições, costumes, etnias e religião de terceiros como sendo ‘suportáveis’ tomando-os como inferiores. Assim sendo, este tentativa de criar um suposto multiculturalismo tanto na Alemanha como no resto da Europa tem como principal problema a assumpção de que há uma cultura dominante e superior em relação às demais. A limitação da liberdade religiosa das minorias muçulmanas e a premissa de que estas se devam adaptar à cultura e valores alemães, colocando de parte a sua própria cultura e especificidades culturais é uma ameaça ao direito à identidade cultural que cada cidadão possui. É o perfeito exemplo da tentativa de criar uma sociedade multicultural onde os imigrantes têm que abdicar de determinados traços culturais subordinando-se à cultura dominante.

Os preconizadores do modelo neoliberal, e neste caso em particular a Alemanha, procuram através da perseguição étnica e racial desviar atenções daquele que é o verdadeiro problema – a crise e recessão económica. É certo que será sempre mais fácil culpar as minorias pelos problemas actuais do que assumir responsabilidades. É desta forma que prossegue a utilização das minorias como uma espécie de bode expiatório e como álibi para a actual situação económica.

Os minaretes na Suíça, a deportação dos ciganos em França e agora a ‘perseguição’ dos muçulmanos na Alemanha são cenários que não se adequam ou pelo não se deveriam adequar ao século XXI. São no entanto, estas as estratégias adoptadas pelo modelo neoliberal para mascarar a crise económica e também o retrocesso dos direitos laborais e sociais. O que têm estes casos em comum? Todos eles utilizam a imagem dos que para eles são os elos mais fracos para desculpabilizar a má política governamental e desta forma desviarem atenções dos principais problemas existentes.

Esta Europa multicultural incentiva a xenofobia e o desrespeito pelas minorias. É importante não incorrer em erros do passado e apostar na criação de uma Europa verdadeiramente pluricultural onde as diferenças culturais vivam em harmonia, em pé de igualdade e sem imposição de supostas culturas ‘dominantes’ e/ou ‘superiores’.

Cláudia Ribeiro

 

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