Notas do fim da história |
Terça, 24 Agosto 2010 | |||
Com o 11 de Setembro/2001, a utopia fukuyamista sofre o primeiro grande abalo. Artigo de Bruno Góis Esta história vem de longe. Podemos dizer que o capítulo que inaugura o movimento socialista moderno nasce com a teoria da mais-valia de Karl Marx. O movimento da classe trabalhadora fica munido com uma teoria que identifica a divergência de interesses entre a classe explorada e a classe que se apropria da mais-valia. A Revolução de Outubro de 1917 inaugura uma série de revoluções socialistas que proclamaram o objectivo do fim da “exploração do homem pelo homem” (e da exploração da mulher acrescentamos nós). Entre 1917 e 1989/91 está a história da experiência do socialismo real eurosoviético. Entretanto, na Europa Ocidental do Pós-Guerra (pós-1945), nascera o modelo social europeu. O forte movimento operário e a necessidade de garantir a lealdade deste movimento no contexto da Guerra fria, a necessidades de mão de obra qualificada e diferenciada a nível técnico e superior, a reconstrução europeia e a necessidade de relançamento económico pelo desenvolvimento da produção e do consumo interno: foram factores geradores da herança social europeia. Com a trégua do Estado-providência, o capital consentiu em ser tributatado como nunca antes, as disparidades entre os vencimentos de topo e os vencimentos médios das empresas foram reduzidas, os direitos laborais foram estendidos, foram criados serviços públicos de saúde, educação e outros, e os movimentos dos trabalhadores redenderam-se à expectativa da progressão indefinida dos direitos sociais. Na sequência da primeira crise de acumulação do modo produção fordista, em que se alicerçava este modelo social, iniciou-se a ofensiva, primeiro intelectual e depois institucional, por parte dos detentores do capital. Em inícios dos anos 80, começa a ofensiva pela 'desfiscalização' do capital, contra os direitos laborais em nome do combate ao desemprego, contra a gestão pública dos sectores da saúde, educação, transportes etc. Com a queda do muro de Berlim e o colapso da União Soviética (1989/91), a alternativa socialista deixou de ser um horizonte possível para a maioria das pessoas e o Neoliberalismo tornou-se hegemónico. O Fim da História foi proclamado por Fukuyama (1992) com a força da sua propaganda de globalização do modelo de democracia, mercado livre e “consequentes” prosperidade e paz mundial. O próprio Choque de Civilizações (Huntington, 1993) não fez mais do que acrescentar este ‘fim da história’ um capítulo de guerra contra as restantes civilizações ditas inferiores. As guerras dos anos 90 não desmentiram esta utopia de Fukuyama por serem cautelosamente classificadas como éticas ou humanitárias. Com o 11 de Setembro/2001, a utopia fukuyamista sofre o primeiro grande abalo. Em nome do combate ao terrorismo, declaram-se guerras ilegais e, a nível interno, são postos em causa direitos e garantias – sendo emblemático o Acto Patriótico nos EUA. As crises Mexicana (1994), Asiática (1997), da 'bolha da internet' (2001) e Argentina (1999-2002) não foram suficientes para abalar o aspecto económico da utopia do fim da história. Contudo, a Crise Financeira de 2007-2010, particularmente desde setembro de 2008, mereceu o título de 'queda do Muro de Berlim do neoliberalismo', ao pôr em causa o dogma da auto-regulação do mercado e o suposto 'dado objectivo' de que não havia dinheiro para sustentar o Estado social. De repente, nos EUA e na Europa, foram mobilizados fundos astronómicos para salvar o sector financeiro, nacionalizando os prejuízos dos bancos. A Crise da Dívida Soberana Europeia, iniciada com o ataque especulativo à dívida grega, deu o mote e o pretexto para um ataque profundo aos conceitos e às bases materiais do Estado social europeu. Conduzidos pelo vanguardismo do sector financeiro todos os sectores da burguesia aproveitam esta boleia no combate às conquistas civilizacionais do Pós-guerra. É especialmente nestes momentos que, para além das trincheiras e dos avanços e recuos estratégicos necessários, é também nessessário renovar a alternativa socialista superando e integrando o acervo das lutas pela libertação e progresso humano.
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A Comuna 33 e 34
A Comuna 34 (II semestre 2015) "Luta social e crise política no Brasil" | Editorial | ISSUU | PDF
A Comuna 33 (I semestre 2015) "Feminismo em Ação" | ISSUU | PDF | Revistas anteriores
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