Existe uma força que retorça o FMI? Versão para impressão
Terça, 17 Agosto 2010

Esta questão será uma das que mais entretém a teorização de uma reforma global do mercado e das próprias nações. Antes de mais, é necessário observar e definir tanto o papel do FMI, actualmente e historicamente, e o raio e consequência de suas acções.

O FMI apresenta-se como um fundo de resposta às necessidades financeiras dos diversos países. Tem, aparentemente, como principais objectivos manter, regular (lembram-se de Constâncio?) e optimizar as políticas económicas de modo a garantir o pleno funcionamento da economia de mercado de raiz capitalista implantado desde o final da II Guerra Mundial.

Na ressaca da recente crise do sub-prime e consequente crise do sistema capitalista, muito se tem escrito e dito acerca do FMI e a discussão “eterna” sobre a reforma dessa supra-estrutura ressurge: Será possível um novo papel para este órgão na cena Mundial?

Um papel de regulador financeiro para garantir um Capitalismo friendly, um papel de garante de acesso ao crédito no caso de países que estejam a passar por extremas dificuldades económicas, de modo a conseguirem responder às crises sociais que daí resultam.

Ora o FMI é um fundo cujos associados têm poder de voto directamente proporcional ao capital que depositam neste fundo, o que garante o poder de decisão aos países mais desenvolvidos.

Conseguimos ter um vislumbre do papel e visão económica para o presente e futuro pondo em análise o seu papel nas ditas “economias emergentes”. A abertura do FMI a essas economias, não cometendo os mesmos erros de falta de informação que próprios economistas do FMI considerariam que foi a principal causa das crises financeiras mexicana e asiática, tem um objectivo claro: submissão ao FMI.

De certa maneira, uma aplicação do pensamento huntingtoniano na economia, através dos bancos, incorporando-os nos bancos internacionais trazendo-lhes tanto acesso a todo um novo raio de acção próprio, mas também, a abertura do seu próprio capital ao interesse das grandes instituições internacionais que desenvolveram a longo do tempo cada vez mais eficazes maneiras de controlo interno.

A outra face do desenvolvimento económico historicamente é marcado pelas crises do capitalismo, em que esta abertura às ditas “economias emergentes” perfaz um ainda maior leque de dois factos: maior propagação dessas mesmas crises, maior dependência dos mecanismos de financiamento do FMI. Podemos afirmar que todo este poder de acção faz do FMI o ideal motor de propagação e manutenção do actual sistema económico de acumulação capitalista.

Antes de prosseguir e porque é importante aprofundar o significado da “intervenção do FMI”, analisemos que quando um país recorre ao financiamento deste fundo, é estabelecido um plano que consiste em cortar sem escrúpulos na despesa pública: deixa de haver dinheiro para prestações sociais e complementos solidários, corta-se a direito nos vencimentos dos funcionários públicos e congelam-se pensões e aumentos. De seguida são inventariados os activos em posse do Estado e é estabelecido um novo plano, agora de privatizações.

Todo o património que possa ser vendido de modo a realizar um encaixe financeiro avultado é posto à disposição dos chamados investidores que conseguem assim obter a preço de saldo posições dominantes nos sectores como a energia, água, transportes, saúde e educação. São estes planos que conseguem uma dramática redução da despesa e um aumento significativo da receita do Estado, equilibrando as contas públicas, à custa de cortes draconianos.

De notar e sublinhar que na sua acção, nenhum ajuste é efectuado ao sistema económico que é a causa da própria “necessidade de intervenção” do FMI. Posto isto, ao País em causa, pouco resta para pagar a sua dívida.

Objectivamente, assim que um país se financia junto do FMI perde toda a soberania, porque o orçamento que é a base para um Governo executar as suas políticas é elaborado sobre estreita indicação e supervisão dos responsáveis por este fundo.
Simplisticamente, institui-se a dependência e passa a reinar a submissão económica.

O Governo em questão, consequentemente, torna-se um Governo de gestão (vejamos o Governo Grego).

Qualquer supra-estrutura como o FMI tem as suas orientações políticas definidas pelos seus maiores associados, ou seja, os países que mais poder económico possuem.

Sendo estes contribuintes conduzidos por políticas neo-liberais é razoável esperar que seja possível uma reforma que transforme este fundo numa cooperativa que distribua o capital disponível “a cada País conforme as suas necessidades“ continuando a financiar-se junto dos países mais ricos? É sequer possível esperar que a acção de ajuda deste fundo não seja orientada para a própria acumulação através de empréstimos de juros exorbitantes para “ajudar” os países que venham a sofrer as crises económicas que o FMI, directamente e indirectamente, também é responsável?

Será possível que o FMI se torne uma espécie de “sopa do Sidónio” à escala Mundial?

Na ressaca da crise, alguns economistas que se auto-denominam de Esquerda, embriagados ainda pela sua fé no mercado apostam na reforma do FMI, do Banco Mundial, do mercado e consequentemente (ou não!) do Capitalismo mundial.

O erro destes pensadores é a sua sobranceria para com a política e a eterna visão que o mercado e as suas leis se sobrepõem à política e às pessoas.

Esquecem-se que o mercado e suas leis, são desenvolvidos e regulados com base numa ideologia: O FMI é financiado e consequentemente dirigido pelo neo-liberalismo.

É com base nesta ideologia que este estabelece as suas orientações e linhas de acção e tem como objectivo alargar a sua esfera de influência através da dívida, que serve como garantia que haverá efectivamente uma colonização ideológica que tem contribuído em muito para o pensamento único económico actual.

Se provas faltassem, não seria de estranhar que o FMI aplica sempre a mesma receita para países tão diferentes como a Argentina ou o Botswana?

Seria estranho afirmar que os países que já tiveram a intervenção do FMI, “aprendam” como repetir a mesma receita do FMI para as seguintes crises económicas?

A razão pela qual a mesma receita é repetida internacionalmente é porque se trata na prática de normalizar a política, a economia e o pensamento. É importante também dizer que exactamente por este facto, a luta pelo pensamento e pela alternativa na economia é essencial actualmente.

O ataque aos direitos adquiridos pelos cidadãos ao longo de décadas de conflitos entre exploradores e explorados que está a ser realizado um pouco por toda a Europa e no Mundo não se coaduna com propostas de reciclagens ou de males menores, e não nos podemos enganar ou deixar enganar pelo refrear da acumulação que algumas opções moderadas possam causar.

Da parte deles, capitalistas, estamos a assistir a um tudo ou nada. Consequentemente temos de estar disponíveis para um tudo ou nada da nossa parte.

O FMI não é um pilar do Capitalismo devido apenas à ideologia neo-liberal dominante dos países que dele fazem parte. O FMI tem opções políticas e estratégia mundial de acumulação tanto para os países que dele fazem parte, como também para si.

Na verdade, ilustrativamente, o FMI é um vampiro. Quando ataca tem duas opções: deixar a vítima morrer, ou torná-la igual a si. O FMI ganha poder com as suas crises, tornando as vítimas das suas crises dependentes do Capital das grandes economias mundiais e do seu “sugar de sangue” patente nos seus planos de “salvação”.

Quanto a reformas o quadro é descomplicado: é chegada a altura dos reformistas pedirem a sua, já têm muitos anos de trabalho ao serviço do Capital, os suficientes para receberem uma pensão choruda.

Francisco Silva e Nuno Moniz

 

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