Mulheres imigrantes Versão para impressão
Quinta, 10 Janeiro 2013

sombra de mulher"O essencial é invisível aos olhos", diz o Principezinho. Descartando a poesia que esta frase, tão usada, encerra em si mesma coloca-se a questão: Será que a invisibilidade dos fenómenos sociais é essencial? A minha resposta, compartilhada com inúmeras pessoas, é um retumbante Não!

Pensemos no fenómeno da imigração: Apesar de na última década o interesse pelas migrações femininas se ter manifestado num aumento de estudos científicos, a categoria homogeneizante de mulher imigrante continua a ser o referencial-tipo, desprovendo as mulheres da sua singularidade e descurando as suas pertenças identitárias que ultrapassam o eixo da nacionalidade e do género. E a gravidez e maternidade acentuam as discriminações, as violências e agravam os indicadores de saúde psicológica, física e sexual/reprodutiva destas mulheres.

As mulheres representam uma parcela muito considerável do universo global da população imigrante que chega a Portugal. Segundo dados do SEF e da Direção Geral da administração interna (2012) estão registados/as 11.301 cidadãos e cidadãs de outros países da União Europeia e 15.656 estrangeiros /as oriundos/as de outros países que não os da União Europeia. Ressaltamos que não há contabilização exata do número de mulheres, mas a constatação que são a maioria da população migrante recém-chegada ao país. Em 2007 Malheiros afirmou que as mulheres representavam, há cinco anos atrás, quase 60% da população estrangeira, número que tem vindo a crescer.

Com o intuito claro que dar visibilidade ao essencial, ou seja, materializar, como se de uma fotografia se tratasse, às discriminações, violências de género e indicadores de saúde psicológica, física e sexual/reprodutiva que as mulheres grávidas imigrantes em Portugal vivenciam, dediquei uns largos meses a uma investigação#, no campo da Psicologia Clinica e da Saúde sobre estes temas. Os resultados obtidos permitiram verificar que as 21 mulheres grávidas e/ou com uma experiencia recente de maternidade no nosso país, de diferentes nacionalidades# que fizeram parte do referido estudo, apresentam indicadores de saúde psicológica, física e sexual/reprodutiva preocupantes, assim como níveis elevados de exposição à violência e à discriminação, existindo um padrão recorrente de não reconhecimento da sintomatologia experienciada e de falta de assistência médica.

Ficou bem patente que este facto deve constituir um alerta para as instituições de saúde, outras instituições governamentais e privadas, associações de imigrantes e ONG's. Apesar do SNS ser, ainda, tendencialmente gratuito para as mulheres grávidas, é notório que há uma inibição clara do seu uso por parte das imigrantes, o que poderá estar relacionado com a estranheza do sistema (e.g., ausência de serviços de tradução e interpretação).

Os valores elevados de sintomatologia psicopatológica encontrados, bem como o não reconhecimento e as não respostas a esta evidência, são motivo de alarme. Constatamos, igualmente, que a precariedade e os, deveras, parcos recursos de muitas destas mulheres, bastante jovens, e suas famílias, sobretudo oriundas da Europa Central, da África e da Ásia, clama por uma visibilidade pública e por providenciar formas de reduzir as diferenças de oportunidades entre estas e as mulheres autóctones, através da disseminação de informação sobre saúde geral e, mais especificamente, sobre saúde sexual/reprodutiva e saúde mental, na sua língua materna e numa linguagem que seja entendida de forma clara.

Destas mulheres 5 foram/são vítimas de violência pelos parceiros. Muitas outras foram/são vítimas de outras formas de violência de género, como a discriminação, a humilhação, a xenofobia e o racismo. Apenas 2 destas vítimas estão a ter acompanhamento psicológico! E aqui surge, mais uma vez, a necessidade imperativa de tornar Visível aos olhos de todos/as o Essencial. Tem de ser criado, de imediato, um plano de formação específica na área da violência de género contra mulheres imigrantes, dirigido a estas mulheres e a profissionais de saúde que lidam de perto com comunidades imigrantes. Para que a iniciativa de revelação da violência possa partir das vítimas ou dos/as profissionais que com elas trabalham é preciso esclarecer sobre os seus direitos, dando visibilidade ao problema, que como se constata é transversal a todas as idades, etnias, nacionalidades, graus académicos e estatutos socioeconómicos.

Portugal está claramente numa fase de readaptação, estando a tornar-se um país com menos recursos económicos, logo menos apelativo para as populações imigrantes. Ainda assim, continua a ser um território que é visto como um "novo mundo" de oportunidades, sobretudo para as populações oriundas de África, Ásia e dos países mais pobres da Europa, como a Roménia, a Bulgária e Albânia, entre outros.

Assim, cabe-nos a nós, investigadoras/es, tornar o essencial visível aos olhos, pois a vida e saúde destas mulheres e dos/as seus/suas filhos/as é um direito universal.

Helena Velho

 

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