O perpetuar da discriminação |
Segunda, 17 Janeiro 2011 | |||
As ditas questões fracturantes como o casamento gay, o aborto ou a legalização das drogas leves, quando mencionadas pelo Bloco Central, são e têm sido ao longo dos últimos anos meras bandeiras eleitorais. O Partido Socialista, por exemplo, coloca consecutivamente medidas relativas a estas questões nos seus programas tendo apenas como objectivo utilizá-las como meras bandeiras eleitorais. Uma espécie de chamariz cujo objectivo é apenas atrair uma determinada fracção de eleitores – visto que no período de governação estas medidas não saem do papel. Por outro lado, também na dita direita portuguesa se joga com questões como os direitos LGBT, não como sendo verdadeiros problemas mas sim como meras estratégias para recolher apoio popular. Um perfeito exemplo disso é a posição que Cavaco Silva tomou relativamente a estes temas no decorrer do último ano.
Se dúvidas haviam de que Cavaco Silva legisla com critério duplo essas dúvidas terão decerto sido dissipadas. Aquando da aprovação por parte do Parlamento do diploma que permitia a casais do mesmo sexo casarem-se, Cavaco Silva decidiu não vetar a mesma afirmando que o país tinha que se preocupar com assuntos mais importantes, desvalorizando assim esta conquista nos direitos individuais e, consequentemente, tentando desacreditar a luta LGBT remetendo-a para um plano de importância inferior. Ora, volvidos alguns meses, outra “matéria fracturante” cai nas suas mãos. O Parlamento, por proposta do Bloco de Esquerda, aprova a lei que permite a mudança de registo civil dos transexuais, terminando assim com uma burocracia discriminatória que afectava os transexuais no seu quotidiano. Desta feita, o Presidente da República veta o diploma. Na política do Bloco Central aprovam-se leis conforme os seus próprios interesses e não necessariamente levando em atenção os interesses dos cidadãos. Este é apenas mais um exemplo disso mesmo. Na primeira situação, pretendendo agradar a gregos e troianos, o social-democrata aprovou (ainda que, segundo ele, relutantemente) a lei, sendo alvo de várias críticas dos sectores mais conservadores da classe política e social portuguesa. Deparado com esta situação, e em plena pré-campanha para as Presidenciais, preferiu voltar às suas práticas de perpetuação da discriminação vetando então este diploma amealhando consenso e apoio destes mesmos indivíduos que meses antes o haviam criticado. É intolerável que a figura máxima do Estado Português perca o foco daquilo que realmente importa, preferindo recolher apoio político do que efectivamente mudar a vida dos cidadãos que representa. A luta LGBT tem somado pontos no decorrer dos anos mais recentes, no entanto, a luta não se pode ficar por meias vitórias. A aprovação do casamento homossexual foi o primeiro passo mas outros lhe deverão seguir caminho. Se a questão da adopção de crianças por parte de casais gays é um assunto tabu, ainda mais tabu são as temáticas relacionadas com o T de LGBT. Infelizmente, e para que a mentalidade social possa evoluir e a discriminação para com estes indivíduos possa desaparecer são necessárias acções políticas. Neste caso, o primeiro passo foi dado no Parlamento, encontrando um obstáculo na figura do Presidente da República. Este preferiu desrespeitar os direitos destes indivíduos perpetuando a discriminação. Não sejamos ingénuos – o conservadorismo está bem patente em cada aspecto do nosso quotidiano. No entanto, cabe às figuras políticas nacionais a tarefa de servir como um possível e importante meio construtor de mudança social. A aprovação deste diploma teria sido, e possivelmente ainda será, factor de diminuição da discriminação para com os transexuais que já são, por si só, vítimas suficientes da mesma (note-se por exemplo que as maiores taxas de desemprego registadas estão entre esta minoria). A visão conservadora e de total desrespeito para com os direitos individuais e civis destes cidadãos é política recorrente do Bloco Central. Cavaco Silva prefere perpetuar a discriminação do que efectivamente abrir horizontes e aceitar a diferença na sociedade portuguesa. É lamentável que, no seu caminho para tentar alcançar uma nova vitória política pessoal, Cavaco negligencie e prejudique ainda mais os portugueses e, neste caso específico, os transexuais. Cláudia Ribeiro
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A Comuna 33 e 34
A Comuna 34 (II semestre 2015) "Luta social e crise política no Brasil" | Editorial | ISSUU | PDF
A Comuna 33 (I semestre 2015) "Feminismo em Ação" | ISSUU | PDF | Revistas anteriores
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