Orgulho LGBT |
Terça, 05 Julho 2011 | |||
Foi a 28 de Junho de 1969 que um grupo de homossexuais, bissexuais e transgéneros resistiu a uma rusga policial no bar Stonewall Inn em Nova Iorque marcada pela violência e preconceito habituais. Não foi a primeira vez que tal aconteceu mas foi o primeiro grande marco na história do movimento. Juntou um grande grupo de pessoas, estendeu-se por vários dias, teve uma maior cobertura mediática e foi também a primeira vez que se tentou dar um carácter mais político à manifestação, fazendo exigências concretas e radicalizando uma luta que até à data era praticamente inexistente. Um ano depois celebrou-se esse acontecimento com a primeira marcha do orgulho LGBT, que com o tempo se espalhou por outros países e que chegou a Lisboa em 1999, ao Porto em 2006 e a Coimbra em 2010. A questão do orgulho LGBT gera por vezes algumas dúvidas acerca da legitimidade do termo. Conhecendo a sua carga semântica negativa, é preciso primeiro tornar claro que ninguém apela ao orgulho numa característica que não se escolhe. Fala-se sim de orgulho em assumir características que a sociedade diz serem erradas e que devem ser escondidas. Não se pode retirar a importância destas manifestações argumentando com a inexistência do orgulho heterossexual. O orgulho heterossexual não existe porque já se supõe que todas as pessoas o são. Porque assim o é, é legitimado socialmente, é dominante e define-se na homo, bi e transfobia. É um conceito político, tal como o orgulho LGBT, mas que se define em tudo o que advém da opressão para com todos os que fogem à norma em função da sua orientação sexual, identidade de género ou forma de viver a sexualidade. Representa o preconceito e discriminação mais extremados para com todos aqueles que não se definem como heterossexuais. É graças a ele que existem vítimas como a Gisberta, que se julga ser aceitável negar direitos a parte da população e que existem países que criminalizam a homossexualidade, onde ela dá direito a pena de morte e onde existem violações correctivas para mulheres lésbicas. O orgulho LGBT define-se precisamente em oposição a isto. Em oposição ao silenciamento, traz-se a visibilidade para as ruas, numa manifestação ou no dia-a-dia. Em oposição à hegemonia heterossexual, trazem-se diferentes formas de ser e de amar nas quais existe espaço e respeito pela diferença. Em oposição à vergonha, traz-se o orgulho. Porque vergonhosos são aqueles que discriminam, não os que são discriminados. A marcha do orgulho LGBT pretende ser um momento de reivindicação de direitos e de visibilidade que quebra o silêncio que existe no resto do ano. Um bom paralelismo parece-me ser a questão do orgulho negro, que celebra uma identidade e um passado e presente marcados por opressões e que surge como contraponto ao racismo. Da mesma forma, o orgulho LGBT surge em oposição à homofobia, bifobia e transfobia presentes na sociedade e que se reflectem na desigualdade de direitos. Porque qualquer pessoa LGBT deve sentir orgulho do seu percurso de resistência quando consegue ultrapassar o preconceito que lhe foi incutido desde sempre e o medo e discriminação da família e da sociedade. Quando nos dizem que o que somos é errado, assumimos a nossa identidade como algo natural, com orgulho naquilo que já conquistámos e na força que temos para lutar por tudo aquilo que ainda falta conquistar. “Casamos mas não calamos” e não nos contentamos com direitos pela metade, com direitos que são atribuídos ao mesmo tempo que outras discriminações são legisladas. O movimento LGBT não pode ficar em espera até a sociedade heterossexual voltar a estar preparada para conceder mais direitos a uma fatia da população. Por isso continuamos a reivindicar a igualdade de direitos e o fim de uma cultura heteronormativa que exclui e discrimina todos os que nela não encaixam. Queremos o direito à adopção de crianças por casais do mesmo sexo, assim como o direito à co-parentalidade. Queremos cirurgias de redesignação de sexo no Serviço Nacional de Saúde. Queremos o direito à procriação medicamente assistida quer para as mulheres casadas com outras mulheres, quer para as solteiras não-inférteis. Queremos o fim do bullying homo, bi e transfóbico que leva ao insucesso e abandono escolar de muitos jovens. Queremos o fim do preconceito que também dificulta a relação com o mercado de trabalho, porque as épocas de crise só agravam as discriminações. Queremos tudo isto sem bandeiras prioritárias, porque não há direitos nem grupos mais importantes que outros. Apesar da mudança na lei que permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e da lei de identidade de género, há ainda muito por conquistar e por garantir. Porque as leis foram mudadas mas a sociedade não. Quando temos no governo uma maioria conservadora e uma secretária de Estado da Igualdade que assume publicamente posições homofóbicas há que lutar pela conquista de outros direitos mas também garantir que os já conquistados não nos são retirados. Érica Almeida Postiço
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