Cacete e pouca cenoura Versão para impressão
Terça, 13 Setembro 2011

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A fábula do cacete, da cenoura e do burro tem hoje em dia uma versão bizarra. Usada desde sempre pelos governos para manter o “bom povo” no redil da ordem dominante, a tática consistia em ir acenando com promessas de uma vida melhor (cenoura), a uma distância conveniente, recorrendo ao cacete sempre que o burro escoiceava ou ameaçava desviar-se do destino previamente traçado.

Nestes dias de chumbo do consulado da troika, a ração de cenouras está a esgotar-se – faisão só para amigos, como o Amorim – e o capataz prepara afanosamente o cacete.

É extensa a lista de malfeitorias do governo PS/PSD. Desde o início do ano lectivo com menos escolas, menos professores e auxiliares, actividades extra-curriculares congeladas, creches sobrelotadas e mais desemprego no sector da educação.

Transportes públicos mais caros e a degradarem-se; o preço dos combustíveis sempre a subir, mesmo quando a cotação do crude baixa; carestia nos bens e serviços essenciais, como a água e electricidade, empurrada pela subida do IVA para 23%.

E a inflação só não disparou (ainda) devido à quebra da procura, forçada pela baixa real e nominal dos salários; pelo roubo anunciado do subsídio de Natal; pela redução do subsídio de desemprego e de todas as prestações sociais, incluindo o abono de família, num país e numa Europa em queda demográfica…

Depois dum brutal aumento da carga fiscal sobre quem trabalha e da recusa do imposto sobre as grandes fortunas, o prometido corte na despesa não afectou as “gorduras do Estado” mas abateu 1500 milhões de euros à Educação, à Saúde e à Segurança Social.

Por exaustiva que seja esta lista, ela estará desactualizada ao chegar à banca dos jornais. Revoltante é a miserável “caridadezinha” dos descontos para pobres que se sujeitem a uma infindável teia burocrática e permitam a devassa das suas vidas, pondo em causa o mais elementar conceito de cidadania e a universalidade dos serviços públicos.

Para quem não acredite no anúncio do “fim da crise” para 2012 (cenoura), Passos Coelho aproveitou a rentrée do PSD para proferir ameaças (cacete) sobre o movimento social de protesto que se vai levantar num Outono quente, já em 1 e 15 de Outubro. O tom de ameaça vai até “quem se entusiasme com as redes sociais e com aquilo que vê lá fora”, evocando “um país de brandos costumes”…

Sabendo que não tem mais cenouras para distribuir, o governo prepara o cacete. Talvez por isso, admitiu que os cortes orçamentais poderão ter excepções nalgumas áreas de segurança. Não tanto nos polícias de giro – em breve poderão repetir-se os episódios de “secos contra molhados” – mas talvez nas secretas que, no intervalo da espionagem empresarial, irão dedicar-se à “nobre tarefa” de vigiar as redes sociais…

As audições de Silva Carvalho, antigo chefe das secretas e actual quadro da Ongoing, são ilustrativas: em nome da pretensa defesa da soberania nacional, temos serviços de informações governamentalizados, fora de controlo parlamentar e usados como fonte de corrupção protegida pelo segredo de Estado.

O verdadeiro alvo, como sempre, é o chamado inimigo interno: os manifestantes, os sindicatos, os estudantes e agora também os cibernautas. É preciso extinguir este cancro da democracia – aqui fica uma sugestão para reduzir o défice…

Alberto Matos

 

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