As cidades dos que são obrigados a partir Versão para impressão
Sexta, 06 Março 2009
A casa não cumpre apenas as funções de abrigo, de construção da família, de lazer, mas é também o lugar onde se reflectem o status social, o estatuto jurídico da propriedade, as desigualdades sociais. Como refere LACAZE1, o alojamento é ao mesmo tempo um objecto técnico, uma obra de arquitectura, uma forma de ocupação da cidade e o quadro de vida quotidiano de pessoas e famílias.

Texto de José Castro 

O ”Estado Novo” não deu qualquer contributo para a resolução do problema da habitação. Pelo contrário. As políticas do regime de Salazar vão consistir no “Programa de casas económicas”: 1.662 habitações  destinadas a aquisição de habitação própria através de renda resolúvel. Criado pelo Decreto-Lei 23052 de 1933 este programa institui, de acordo com o ideário fascista,  mecanismos de controlo dos moradores e exclui as classes pobres do acesso à habitação.

Como exemplo da visão ideológica sobre as tipologias da habitação, veja-se a curiosa afirmação de Etienne De Groer (um dos urbanistas estrangeiros vindos para Portugal nos anos 30/40 do século passado):

“Os edifícios grandes são um campo aberto ao comunismo, não sendo por isso preconizados senão pelos partidos da extrema-esquerda” . 

Em 1969 é criado o Fundo de Fomento da Habitação (FFH). Mas entre 1969 e 1973, o FFH2 apenas promoveu a construção de 2.000 fogos em todo o país.

Entende-se por isso que após o 25 de Abril de 1974, a Assembleia Constituinte, dada a absoluta necessidade da intervenção dos poderes públicos, desse relevo político-social à habitação, consagrando-a na Constituição aprovada em 2 de Abril de 1976. O direito à habitação é um direito fundamental de natureza social.

Mas a política de sucessivos governos não foi nesse  sentido. Para além de terem sido desbloqueados programas existentes no FFH e que permitiram a adjudicação de 21.000 fogos logo em 1975, o que marcou foi a fraquíssima promoção directa pelo Estado. Aliás, com a Resolução do Conselho de Ministros de 24/2/1976 sobre política de crédito à habitação deu-se um primeiro passo para liquidar a já débil intervenção estatal. “O objectivo das medidas foi o relançamento da indústria de construção civil, através duma política mais favorável de financiamento ao comprador em ordem a proporcionar a muitos agregados familiares a possibilidade de adquirirem a sua própria casa”3.

O crédito à habitação passou a ser a  principal fonte dos lucros do sector bancário: como exemplo, no 1º trimestre de 1999, mais de 150 milhões de contos4.

Conforme foi referido no VI Fórum da Habitação realizado pelo Instituto Nacional de Habitação (INH) em 17/3/2000, “o crédito à aquisição de casa própria foi a mais permanente das medidas de política de habitação”.  O Estado concedeu, anualmente, entre bonificações e beneficíos fiscais, cerca de 200 milhões de contos.

O número de novos fogos construídos por promotores privados passou a ser de 100.000 por ano. Mas milhares de famílias continuaram sem acesso a uma habitação digna.

José Castro 

 


O presente texto faz parte de uma comunicação intitulada Habitação no Porto ou a Cidade dos que são Obrigados a Partir apresentado no Fórum pela Cidade do Porto, que decorreu na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCE-UP) no dia 21 de Fevereiro de 2009.


 1  JEAN PAUL LACAZE, “Les politiques du Logement”, Paris, 1997

2 O Fundo de Fomento da Habitação (FFH) tinha sido criado em 1969

3MARIA PROENÇA, “Notas sobre a proposta de política de crédito à habitação” in “Livro Branco do SAAL – 1974/76”

4 in “Diário Económico” de 12/8/99 

 

 

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