A centralidade do trabalho Versão para impressão
Segunda, 21 Setembro 2009
O Trabalho tem ocupado um lugar central nas linhas orientadoras da Esquerda, em particular das suas correntes comunistas, baseando-se num conceito de que o trabalho é (quase) condição de existência e que Ele ocupa um papel fundamental no desenvolvimento da sociedade.

Artigo de Ricardo Salabert

Por si, esta linha de pensamento é absolutamente válida, desde que consigamos reflectir o que se considera “Trabalho”.

Não vai longe o tempo em que ser escritor ou pintor era (ainda é?) sinónimo de boémia e liberdade das amarras inerentes às lógicas capitalistas de “produtividade”.
Sobram, também, demasiados dedos de uma mão ao contar as décadas que nos separam do tempo em que ser progenitor era “actividade” exclusiva da Mulher e considerada razão máxima da sua existência. Era uma (e única) actividade a tempo inteiro e não era (tal como ainda não é) remunerada.

O papel de uma mãe ou pai no desenvolvimento psico-social de uma criança será menos importante que o papel desempenhado pelas e pelos profissionais de educação?
Nem sequer está em causa o enriquecimento pessoal que uma e outra actividade potenciam, dado que, enquanto mulheres e homens de esquerda, não nos deve ser aceitável conceber o exercício de uma qualquer actividade profissional que não seja motivada por um alargado desejo pessoal. Isto é, aliás, um dos pontos que nos separa dos entusiastas do neo-liberalismo, cuja máxima é a obtenção de Capital (a qualquer custo).

Põe-se, então a questão do que é o “Trabalho”?
O que o define e porque defendemos o direito ao “Trabalho”?

É de vital importância esta reflexão, num momento em que vemos cada vez mais direitos serem subtraídos a que exerce actividades remuneradas; num momento em que cada vez mais se “oferecem” estágios não-remunerados.

Nas últimas revisões da legislação laboral, temos sido confrontados com a necessidade de combater o retrocesso que nos apresentam no (des)equilíbrio da relação empregador-trabalhador.

Actualmente, as excepções ao trabalho precário não passam disso – excepções! Todas e todos nós já fomos, somos ou conhecemos precários e precárias.
Face à gravidade e brutalidade desta situação, só podemos pensar mais além e discutir alternativas ao modelo selvagem do lucro fácil, que cada vez mais procura reduzir os custos do trabalho.
Pela premência da remuneração, assistimos constantemente a situações escandalosas como a de turnos de enfermagem que superam as 10 horas consecutivas e 8 dias consecutivos de trabalho. O paradigma máximo da exploração do elo mais fraco – o trabalhador – com a agravante de este ser um sector com 1500 novos profissionais desempregados por ano.

Este é, também, u dos factores que contribui para a existência do papão “Crise”, em nome do qual se restringem direitos, se reduz a força de trabalho e se estagna o salário aos que se mantêm a laborar.
Esta visão a curto prazo; esta tentativa vã de responder à diminuição da procura leva a que, devido aos parcos rendimentos e devido à instabilidade laboral, haja uma contenção de despesas por parte de quem vive do preço do seu trabalho, alimentando esta bola de neve. Baixos rendimentos, baixo consumo, baixo escoamento de stocks, diminuição das margens de lucro… o resto, infelizmente, sabemos como corre.

Uma resposta socialista deve ser aquela que garante, a todos e todas, condições que invertam esse ciclo, quer através de um rendimento monetário, quer através de um plafond para aquisição de bens que se considerem essenciais.

Antes, contudo, da discussão do modelo, há que abrir campo à discussão do papel do Trabalho na sociedade actual. Será ele edificante e modelador do indivíduo, ou asfixiante e impeditivo do pleno desenvolvimento?

Ricardo Salabert

 

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