“Renuncio formalmente a meus cargos no Partido, a meu posto de ministro, à minha patente de comandante e à minha cidadania cubana. Legalmente nada me vincula a Cuba, só laços de outra ordem que não se podem quebrar com nomeações.” Carta de Ernesto “Che” Guevara a Fidel Castro.
“Ao contrário do que se possa pensar, em Cuba há eleições livres e democráticas.
O que não existe em Cuba é campanha eleitoral, qualquer partido (inclusive o partido comunista), está proibido de apresentar ou apoiar candidatos às eleições.
Os candidatos são propostos pelos cidadãos reunidos em Assembleia.
Qualquer cidadão é livre de se candidatar e depois de apresentada a disponibilidade destes, são escolhidos quais os que se apresentarão como candidatos ao Município, à Província e à Assembleia Nacional.
Serão eleitos entre dois a oito candidatos dependendo do número de habitantes por Município.
Quando este processo de escolha pelos cidadãos dos candidatos está completado, passamos ao período eleitoral propriamente dito.
Neste período realizam-se as eleições, por voto secreto, universal e não obrigatório onde os candidatos para serem eleitos têm de obter 50% mais um dos votos.
Inclusive Fidel Castro tem de ser proposto pelos cidadãos e alcançar 50% mais um dos votos para poder ser eleito para a Assembleia Nacional e posteriormente obter 50% mais um dos votos desta para ser eleito Presidente.
Como não há campanha eleitoral?
Em Cuba, não existe campanha política. É proibido fazer campanha política.
Sabem qual a única campanha política que se aceita em Cuba?
Uma vez que os moradores se reúnem na Assembleia nas distintas zonas, nos distintos lugares, nas distintas circunscrições, cada um, tendo escolhido o seu candidato, apresenta uma biografia de sua vida, desde quando era pequeno até o momento da eleição: quem é, onde trabalha, o que tem feito pelo país, se foi julgado alguma vez, se cometeu delitos, onde milita – se é católico, se é evangélico,
se é comunista. Como é sua vida, o que tem feito pelo país.” ¹
Acresce que as eleições em Cuba são piramidais e portanto a população não vota para o parlamento, para o Presidente da República e não pode escolher entre caminhos ou as propostas políticas diferentes. E se fosse assim em Portugal que diríamos?
Mas, fixemo-nos nos parágrafos anteriores enquanto lançamos um olhar sobre o artigo 5º da Constituição Cubana:
“ARTIGO 5. O Partido Comunista de Cuba, um seguidor das ideias de Martí e do marxismo-leninismo, e da vanguarda organizada da nação cubana, é a maior força motriz da sociedade e do Estado, que organiza e orienta o esforço comum para as metas de construção do socialismo e do progresso em direcção a uma sociedade comunista.”The Communist Party of Cuba, a follower of Martí's ideas and of Marxism-Leninism, and the organized vanguard of the Cuban nation, is the highest leading force of society and of the state, which organizes and guides the common effort toward the goals of the construction of socialism and the progress toward a communist society,
Os candidatos são eleitos desde a base, podemos eleger um camponês com baixa escolaridade para a Assembleia Nacional, até para presidente, do mesmo modo que podemos eleger um cidadão com formação superior.
É possível eleger um cidadão mais abastado ou um mais humilde, visto que ambos se apresentam em igualdade de circunstância.
Não há as discrepâncias entre partidos com maior ou menor financiamento, garantindo assim um princípio de igualdade que não é garantido nas chamadas Democracias Ocidentais.
À primeira vista parece tudo tão correcto, tão transparente, tão democrático.
Voltemos então ao artigo 5º da Constituição Cubana que explica bem a orientação ideológica subjacente ao Regime.
Podemos eleger então qualquer cidadão para nos representar, desde que ele se comprometa a ser Comunista.
Por momentos lembra Henry Ford quando dizia que os seus Modelo T podiam ser adquiridos na sua cor preferida, desde essa cor fosse o preto.
Ao implicar a maioria da população na responsabilidade electiva (50 % mais um dos votos é o mínimo para se poder ser eleito), o Estado Cubano consegue assim manietar qualquer possibilidade de revolta contra o poder instalado.
O voto não é obrigatório mas é visto como um dever de responsabilidade e nos dias de votação, delegados eleitorais correm os Municípios a avisar as pessoas para “não se esquecerem de ir votar”, resultando assim em participações maciças dos eleitores em percentagens superiores a 90%.
Se os eleitores escolhem livremente os seus candidatos, se votam directa e secretamente e se têm acesso aos seus eleitos (estes são obrigados a receber semanalmente os seus eleitores), como podem os Cubanos dizer que não há democracia?
Há eleições sim. Não há é escolha e sem escolha não há Democracia.
As eleições em Cuba não são mais do que a eleição de funcionários burocratas que fazem o favor de receber os eleitores, apontar as suas queixas e dar-lhes seguimento.
Votam nas peças do motor político de Cuba, mas não têm a mínima hipótese de escolher o rumo, as ideias, as orientações.
Ficam privados de qualquer hipótese de revolução porque ao participarem de modo tão directo nas eleições e na escolha dos seus representantes, ao revoltarem-se estariam a revoltar-se contra eles próprios.
Ao participarem tão a fundo tornam-se cúmplices.
Este é o paradoxo da revolução Cubana: O Estado revolucionário aniquila qualquer hipótese de levantamento popular porque será contra-revolucionário, traição à pátria e desrespeito máximo pelo seu concidadão Cubano.
O Estado é Comunista, o povo é o Estado, logo o povo é Comunista, quer queiram quer não.
A única alternativa que lhes resta é renegarem a Constituição e consequentemente a nacionalidade Cubana, pois pela lei fundamental do Estado Cubano se são Cubanos são Comunistas não havendo mais nada a dizer sobre isso.
Então e nós que tanto falamos de Cuba temos Democracia?
Provavelmente as nossas eleições são tão livres como em Cuba, temos financiamentos desiguais, Media tendenciosos parciais, pensamento único Capitalista, representatividade indirecta, sistemas judiciais vergonhosos e parciais…
No entanto, nós temos a hipótese de nos revoltar contra “eles”.
“Eles” roubam, “eles” mentem, “eles” levam-nos para a guerra…até um dia em que nós nos fartamos e decidimos alterar a situação a que chegámos.
A revolução continua a ser um direito efectivo para nós.
Em Cuba não há debate nem há discussão política nem ideológica: é proibido não por decreto mas por inerência lógica do pensamento Humano.
Ninguém no seu prefeito juízo vai pensar política, ninguém porque nesse preciso momento deixaria de ser Cubano, deixaria de ser revolucionário.
Muito mais do que gostar de Fidel, amam a revolução, amam Cuba e o serem Cubanos.
Estão presos à sua imensa liberdade e participação, por isso só lhes resta esperar e esperar…até quando?
Francisco Silva
¹ ”Eleições e Democracia em Cuba”, Palestra do prof. Eddy Jimenez Universidade de Havana