O salário |
Terça, 05 Outubro 2010 | |||
O Governo, pela voz do Primeiro-Ministro José Sócrates e do Ministro das Finanças Teixeira dos Santos anunciou o PEC 3 – as medidas de austeridade para 2010 e 2011. Artigo de Helena Pinto Com ar carregado, Sócrates começou por dizer que é necessário agir, agir para responder aos impacientes mercados financeiros, agir para controlar o défice, agir para sair da crise. Em Maio deste ano tinham dito o mesmo, talvez com palavras diferentes, mas exactamente o mesmo quando aumentou os impostos e fez o mais brutal dos ataques ao Estado Social. Eram “sacrifícios necessários” que permitiam equilibrar as contas públicas. PSD ajudou, assinou e pactuou. Pediu desculpa, mas serviu de muito pouco. As medidas então anunciadas, para além de significarem um ataque brutal às condições de vida dos mais pobres, atingiam milhões de portugueses e portuguesas e encerravam um objectivo muito concreto e por vezes não completamente visível – baixar o valor do salário. A receita neo-liberal para a saída da crise não passa só pelas medidas de austeridade, quer arrecadar uma baixa significativa dos salários. E aqui PS e PSD estão de acordo, por mais teatro que exista em torno da viabilização do próximo Orçamento de Estado. E aí está a medida, os salários da Administração Pública acima de 1.500 euros vão baixar, na globalidade 5%. Não é uma medida provisória ou temporal. Aliás Teixeira dos Santos corrigiu de imediato José Sócrates sobre esta questão na conferência de imprensa. O corte é para manter e todas as negociações sindicais que se seguirem (nos próximos anos) partirão dos valores agora definidos. Está conseguido o primeiro objectivo e ninguém duvide de que as tentativas para baixar todos os outros salários vão continuar. Aliás, a Confederação dos patrões veio de imediato dizer que a medida é muito positiva e devia ser alargada ao sector privado. Por outro lado, a pressão para não proceder ao aumento do salário mínimo (um acordo histórico, segundo Sócrates) já está na calha. Estamos perante um ataque direccionado aos trabalhadores e trabalhadoras, no qual a questão do salário é central: um nível de desemprego altíssimo, sem protecção social e com a agravante de cada desempregado(a) quando reingressa no mercado de trabalho o fazer com um salário inferior aquele que recebia quando estava empregado; redução efectiva do salário dos funcionários públicos; uma estagnação do salário mínimo nos valores que conhecemos e que são dos mais baixos da Europa e agravamento da situação do trabalho precário. É isto que está em marcha. A consolidação do modelo de baixos salários, vínculos precários e ausência de direitos e de um exército de desempregados(as) depauperado que aceitará as condições que lhe forem impostas. As juras de defesa do Estado Social e da Constituição são palavras sem conteúdo perante a prática do Governo. E é preciso repetir. PS e PSD estão de acordo e apadrinhados por um autêntico lobby da desgraça, cujas propostas acrescentam crise à crise e recessão à recessão. E Cavaco Silva, paira, cheio de incógnitas e meias palavras, mas dizendo sempre o mesmo – entendam-se na austeridade. Nas medidas anunciadas o contraste é evidente. O Governo sabe exactamente quanto vai cortar e o que significa em termos de receita, ao mesmo tempo que anuncia um novo imposto sobre o sector financeiro, que não sabe quanto é, nem quanto vai significar de receita. Sócrates não sabe, mas o presidente da Caixa Geral de Depósitos adianta-se – seja quanto for, vai reflectir-se nos clientes… Palavras para quê? É a finança portuguesa no seu melhor. Com mais estas medidas, que retiram o abono de família a quem ganha 600,00 euros mensais (!!), acrescentam mais um corte de 20% ao Rendimento Social de Inserção (muito mais do que foi reclamado por Paulo Portas), retiram a comparticipação nos medicamentos a milhares de idosos e aumentam tudo, mas tudo (nem o cartão de cidadão escapou…), a pobreza vai aumentar a par do desemprego, a “retracção na procura interna” não é a mais do que a recessão. Esta é a situação a que assistimos por toda a Europa. A chamada “resposta europeia” à crise e à “desregulação” dos mercados falhou redondamente e os governos curvam-se perante a “autoridade dos mercados financeiros”, essa coisa opaca, refúgio dos poderosos, a que os neo-liberais de serviço nunca farão frente. Só há um caminho. A denúncia e a luta, numa acumulação de forças à esquerda que credibilize uma alternativa. Está convocada uma greve geral. É preciso que seja um êxito e que constitua uma etapa na organização dos trabalhadores(as) e na tomada de consciência daquilo que está em causa. Fala-se muito de “medo social”. Ele existe. As pessoas estão apreensivas quanto ao seu futuro e dos seus filhos e filhas. Mas cada vez que se perde um direito ficamos mais longe de inverter esta situação. Estão colocados grandes desafios ao movimento sindical, já mesmo na preparação da Greve Geral. Conquistar um a um e uma a uma tem que ser a palavra de ordem. Os trabalhadores e as trabalhadoras são quem constrói a Greve Geral. Nas filas às portas da Segurança Social, a demonstração mais degradante da política dita social deste Governo, um cidadão dizia: “tanta luta que fizemos, para acabarmos aqui”. É essa luta que é preciso reanimar, para dar corpo e expressão à maioria que quer defender o Estado Social.
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A Comuna 33 e 34
A Comuna 34 (II semestre 2015) "Luta social e crise política no Brasil" | Editorial | ISSUU | PDF
A Comuna 33 (I semestre 2015) "Feminismo em Ação" | ISSUU | PDF | Revistas anteriores
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