A voracidade dos dominantes é tal que a guerra aos povos é cada vez mais evidente.
Artigo de Bruno Góis
Venderam-nos (e comprou quem quis) a ideia do “Fim da História”, do triunfo da triologia da democracia liberal, economia de mercado e (“consequente”) paz mundial. As guerras “étnicas” ou “humanitárias” dos anos 1990 eram apenas “excepções”, últimos vestígios dos modelos ultrapassados.
Com o 11 de Setembro, veio a declaração da guerra geral ao “Terrorismo” (conceito “utilmente” indefinido no Direito Internacional) e sob essa bandeira suspenderam-se direitos e garantias, na esfera interna – o caso do Acto Patriótico nos EUA – e invadiram-se estados: o Afeganistão e o Iraque.
Vinte anos depois da queda do Muro de Berlim, a realidade não é a do “Fim da História”, o “Choque de Civilizações” não impede “negócios da China” ou das Arábias, o “Império” sem centro de Negri é pura miragem face ao papel fundamental do estados e suas organizações na guerra, na desregulação financeira, no socorro à banca e no endossar de ataques especulativos como aquele que está em curso contra o euro e os povos europeus.
É igualmente verdade que o mundo de hoje já não é o da teoria do imperialismo de Lenine, o imperialismo do choque entre potências que derivava da existência das burguesias nacionais monopolistas. Hoje, na era das corporações transnacionais, existem burguesias com interesses transnacionais que, ainda assim, não abrem nem podem abrir mão do poder que exercerem através dos vários estados. Note-se que os americanos vêem, hoje, com bons olhos e sem desconfiança o investimento europeu na defesa (querem dividir os custos da guerra e até lucrar mais alguma coisa na venda de material bélico). E as outras potências e organizações internacionais são vistas como parceiros necessários e desejáveis.
O imperialismo persiste, mas sob outra forma. Alcançou a dimensão Global, aperfeiçoou-se, mas também encontrou novas contradições e novas rivalidades. A tendência não é para a Guerra entre potências imperiais (como era no tempo de Lenine); agora a tendência é para ‘a guerra unida das potências contra todo o mundo, contra todos os povos’: desde a guerra entre a Finança Global e as economias nacionais às guerras coloniais no Iraque e na Palestina ou mesmo à guerra ao Estado social e à perseguição de minorias étnicas, como ilustra o recente caso dos ciganos em França.
Os impérios e a hegemonia burguesa trazem às subjugadas e aos subjugados uma aparente paz que mais não é que a cristalização/normalização das violências da ordem estabelecida. Mas nem mesmo essa 'paz aparente' dura. A voracidade dos dominantes é tal que a guerra aos povos é cada vez mais evidente. A luta política e social pela hegemonia das exploradas e dos oprimidos é fundamental para a defesa e o aprofundamento da democracia e para a conquista de uma paz que abra caminho a um mundo onde o livre desenvolvimento de cada um e cada uma será condição para o livre desenvolvimento de todas e todos.
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