Educação - Universal ou ao serviço do capital? Versão para impressão
Segunda, 30 Agosto 2010

O arranque do novo ano lectivo acontecerá em tumulto, por força dos concursos de colocação de professores (que ano após ano parece falhar numa ou noutra vertente) e por força do encerramento de mais de 600 escolas do ensino básico.
 
O número, por si só,  soa a uma enormidade, mas uma análise dos nomes das escolas que dão corpo a este número revela a razão da preocupação de milhares de mães e pais quanto ao início das aulas – como se vai fazer chegar a criança à escola?
 
Se tivermos em conta que destas cerca de 650 escolas, são 600 as que correspondem a concelhos limítrofes, muitos dos quais pertencentes a distritos do interior do país, facilmente constatamos que, não havendo informação segura da garantia de transporte das crianças, esteja em causa a sua permanência no sistema de ensino desde terna idade.
 
Muitos dirão que nalguns dos concelhos mais afectados, a população tem recursos para soluções educativas alternativas, o que leva a um conjunto de considerações que importa trazer à luz do dia, começando pela reflexão sobre o conceito de serviço público.
 
Com o pretexto da baixa rentabilidade das escolas com poucos alunos, encerram-se alguns estabelecimentos de ensino, que por sinal estão em zonas afastadas dos centros urbanos agravando as dificuldades sentidas pela população que ainda resiste em permanecer naqueles espaços, aumentando o peso (e os custos) da interioridade, fornecendo argumentos para a desertificação.
 
Um serviço público educativo, que se quer universal, não pode ter como fim máximo a rentabilidade do sistema. O serviço público que vive a obsessão cega do défice que gera não cumprirá nunca o seu objectivo máximo de servir a população. Os serviços públicos devem ser pensados numa lógica de proximidade e no que toca aos serviços educativos, devem estar inseridos nas proximidades das residências dos seus alunos e alunas. O contrário significa perpetuar erros crassos e, desde muito cedo, envenenar a alma daquelas e daqueles que deveria servir. Uma escola situada a dezenas de quilómetros de casa implica tempo perdido em deslocações, que se subtraem ao tempo de lazer, condição essencial para infância e juventude sãs; ao mesmo tempo que aliena, cortando os laços de umas crianças com outras suas vizinhas. A escola, é uma das principais fontes de sociabilização e os seus recreios, uma fonte de aprendizagem informal, que favorecem o sentido de comunidade.
 
Este modelo de gestão das escolas vem retomar, de forma consciente, as práticas inconscientes (mas não inocentes) de há cerca de 40 anos, fazendo com que os que mais precisam da Escola a vejam fugir do seu local de residência e trabalho.
 
Com este modelo, com laivos tendencialmente privatizadores, as populações mais desfavorecidas são penalizadas, enquanto que as mais favorecidas permanecem imutáveis no privilégio (que lhes é legitimo).
 
Em suma, para além do ataque aos mais elementares direitos constitucionais e universais sobre o acesso das crianças à Educação, esta é mais uma forma da sociedade burguesa se auto-perpetuar, garantindo o acesso à Educação para os seus, tratando com desdém aqueles e aquelas que nascem fora da urbe.

Artigo de Ricardo Salabert

 

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