Brasil: "Copa, PM e detenção" |
Terça, 25 Fevereiro 2014 | |||
Pode o Estado Brasileiro sequestrar cidadãos por duas horas sob chuva sem ao menos dizer o que estava acontecendo? Dei azar e fui levado à delegacia.
Depoimento de Vinicius Moraes, militante da JSoL
Ontem [22-Fev-2014], em SP, ocorreu o segundo ato de contestação à Copa do Mundo no Brasil. Protesto muito justo, afinal gasta-se montanhas com obras faraônicas sem retorno social, enquanto os direitos sociais são parcos. A manifestação contou com um contingente enorme de policiais, incluindo a "tropa do braço". Saímos pacificamente da Praça da República em direção da Praça Roosevelt, viramos à esquerda na Consolação, sentido o Theatro Municipal. Quando chegamos na altura no metrô Anhangabaú, ainda não sei explicar o porquê, começou um empurra-empurra mais ou menos no meio da passeata. Eu e outros grandes amigos estávamos à frente, quando ao percebermos que a confusão iria se alastrar rapidamente. Não fomos rápidos o suficiente. Ao corrermos, entramos em um corredor polonês sem saída formado por duas colunas do policiais militares, que de modo mais do que violento, comprimiram dezenas de manifestantes (lembremos: estes manifestantes sequer souberam a razão do conflito) à base de cacetadas, escudadas e spray de pimenta. Um verdadeiro show de democracia e civilização. Sob berros ameaçadores, fomos obrigados a sentar no meio da Xavier de Toledo, um em cima dos outros devido à falta de espaço físico. Quem levantasse, era lembrado de que deveria ficar sentado com sutis cacetadas, que foi o meu e o caso de muitos outros. Questionar? Fora de cogitação. Um policial, no auge da sinceridade, bradou "aqui não há democracia por que vocês estão detidos". Claro. Democracia e detenção são termos necessariamente opostos, pelo na visão da Polícia Militar de São Paulo. Ficamos ali sentados por duas horas e pouco, de baixo de chuva. Alguns foram liberados, em especial os que não pareciam "ameaçadores". Um oficial falou com todas as letras: "quem tiver referência a movimento social, será levado para a DP". Imagino que o tal oficial levou bem o manual das forças armadas, que demonstra como lidar com as 'forças oponentes do Estado'. Médici deu três mortais para trás de felicidade quando ouviu o policial bem treinado. Durante todo o tempo na rua, não fomos informados do que se passava, quanto tempo ficaríamos ali e qual seria o procedimento. Pode o Estado Brasileiro sequestrar cidadãos por duas horas sob chuva sem ao menos dizer o que estava acontecendo? Dei azar e fui levado à delegacia. No ônibus, que horror! Os policiais são inacreditavelmente mal formados. Reproduzem valores e frases consolidados na ditadura militar. Provocavam os manifestantes. Insinuavam abertamente forjar prova contra manifestantes que os irritassem. E isso o tempo todo e não só no ônibus. Cantavam as palavras de ordem das manifestações. Um lembrou de uma: "gambé cuzão, larga a arma e vem na mão". E em seguida disse "e aí? Não é isso que vocês cantam? Vem pro pau agora, seus pau no cu? Não aguentam nem um tapa na cara?". Ligaram o rádio do ônibus e disseram inaugurar a 'balada black bloc'. Tocou Rita Lee. Na delegacia, mais chá de cadeira. Perguntávamos aos policiais civis qual seria o procedimento e nos respondiam com ironia. As provocações não cessavam. Por volta das 23 e 30, chegou um advogado que me tirou da detenção para averiguação. Não sabia se era o Horácio Neto ou a Virgem Maria. Tudo isso ocorreu porque ousamos questionar a Copa. De fato, a questão social no Brasil ainda é vista como caso de polícia. Aliás, uma polícia que age por fora da lei, que é imoral, ilegal e ilegítima. Mais importante: uma polícia que não pode existir. Uma polícia que promove mais violência e atentados contra os direitos humanos. Fora PM do mundo! A melhor resposta que podemos dar é continuar nas ruas. Não devemos nos intimidar. Não devemos aceitar o atual estado de coisas. "É preciso não ter medo. É preciso ter coragem dizer". Aos amigos que se preocuparam, muito obrigado. A solidariedade das pessoas foi muito grande. Nos solidarizemos cada vez mais com as causas de todas pessoas.
Depoimento do Vinicius Moraes militante da JSoL - Juventude Socialismo e Liberdade, São Paulo
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A Comuna 33 e 34
A Comuna 34 (II semestre 2015) "Luta social e crise política no Brasil" | Editorial | ISSUU | PDF
A Comuna 33 (I semestre 2015) "Feminismo em Ação" | ISSUU | PDF | Revistas anteriores
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